Em celebração aos 150 anos da imigração italiana em Santa Catarina, o Portal Olhar do Vale lançou o projeto “Memórias à Mesa”, um web documentário em vídeo que promete emocionar e conectar gerações através da culinária e das histórias familiares. O primeiro episódio já está disponível no YouTube e apresenta a Dona Maria Salete Stedile, do Lajeado Alto, Guabiruba, preparando uma autêntica polenta com galinha caipira, revelando um verdadeiro banquete de lembranças e tradições.
O webdocumentário tem como objetivo preservar a rica história e cultura italiana, utilizando a culinária como um elo entre o passado e o presente. Cada episódio convida um descendente italiano a compartilhar suas memórias enquanto prepara uma receita tradicional herdada de seus antepassados. A produção, com alta qualidade audiovisual, garante uma experiência imersiva e visualmente impactante.
O Sabor da Tradição e a Força da Memória em Lajeado Alto
No coração de Lajeado Alto, um reduto de forte colonização italiana, a equipe do Olhar do Vale foi recebida por Dona Salete, que sempre morou na localidade, é descendente de tataravós que vieram da Itália em busca de uma vida melhor, há 150 anos. A realidade, no entanto, foi desafiadora. “Pelo que eles falaram, eles vieram com aquilo que eles iam ter uma vida melhor do que lá na Itália, né? Mas foi ao contrário, diz que quando chegaram aqui ficaram muito surpresos. Porque pegaram uma localidade que era muito moro, né? Não tinha nada preparado e aos poucos eles foram fazendo, cada um fazendo as suas casinhas. Era tudo gente simples”, relata Dona Salete, pintando um quadro da resiliência dos primeiros imigrantes.
A receita escolhida para o primeiro episódio não poderia ser mais representativa: polenta com galinha. O preparo, feito em um tradicional fogão a lenha, é uma ode à autenticidade da gastronomia italiana e à autossuficiência de uma época. “Desde o preparo da polenta, é o milho que nós plantamos aqui, aí a gente faz o fubá, né? Que a gente tem a tafona mesmo, né? E os temperos, a salada, o aipim, a batata, tudo que nós vamos fazer hoje aqui é plantado por nós aqui mesmo”, explica Dona Salete, ressaltando o ciclo completo da produção caseira.
Enquanto a galinha dourada lentamente na banha, a anfitriã compartilha detalhes de sua infância. A vida era humilde, mas cheia de “convivência muito bonita e muito legal”. Com dez irmãs, pai, mãe e avó na mesma casa, as dificuldades eram superadas com união e simplicidade. “A gente na época não tinha geladeira, não tinha nada. A gente lavava a louça de uma gamela… A gente tomava banho de bacia, não tinha chuveiro, porque não tinha energia”, recorda, pontuando a chegada da eletricidade por volta de 1975/76.
A comida, mesmo simples, era farta. Carne de galinha, por exemplo, era reservada para os domingos. Nos outros dias, o menu era composto por ovos, linguiça, batata doce, feijão, polenta, aipim e salada, tudo cultivado na roça. A mesa, embora simples, era servida com carinho. Dona Salete lembra da mãe dividindo pequenos pedaços de linguiça com ovos para que todos os 13 membros da família pudessem comer. Apesar da escassez, a felicidade prevalecia. “Mas a gente era feliz, a gente brincava, com tudo isso dali a gente passou dificuldade, né? Mas foi uma época muito feliz.”
O Segredo de Dona Salete: Amor e Carinho
Questionada sobre o segredo de sua culinária tão saborosa, Dona Salete não hesita: “Olha, para mim o segredo é ter vontade de fazer amor, fazer a comida, né? Que eu adoro fazer comida. E os temperos que a gente usa aqui, mas segredo não tem nenhum. É tudo muito simples”. Ela enfatiza que o ingrediente principal é o amor e o carinho no preparo, além de usar apenas temperos colhidos em seu próprio sítio.
Durante o preparo, fomos apresentados a tafona, uma máquina fundamental para moer o milho e produzir o fubá fresco. Seu Luth Comper, marido de Dona Salete, orgulhosamente apresenta a máquina de mais de 60 anos, movida a roda d’água, que continua em uso. “A tafona é uma máquina de tradição dos italianos para moer o milho, para fazer polenta, para fazer pão de milho, fazer o fubá?”, explica, ressaltando a relevância cultural e o apego às raízes.
A Polenta: Uma História de Resiliência e Tradição Italiana
A polenta, protagonista desse primeiro episódio, tem uma história tão rica quanto saborosa. Sua origem remonta à região norte da Itália, onde, antes da chegada do milho à Europa (após o descobrimento das Américas), era feita principalmente com farinha de aveia, trigo ou outros cereais. Era a base alimentar da população e até mesmo dos legionários romanos, conhecida como “pultem”.
Com a introdução do milho na Europa, no século XV, e seu cultivo abundante no norte da Itália, a polenta passou a ser predominantemente feita com farinha de milho, tornando-se o principal prato em regiões como o Vêneto e Friuli-Venezia Giulia. O que antes era considerada uma “comida de pobres” ganhou status e se tornou um símbolo da culinária italiana, sinônimo de aconchego e tradição familiar, especialmente para os imigrantes que a trouxeram para o Brasil.
Receita de Polenta com Galinha de Dona Salete
Ingredientes:
- Fubá (idealmente caseiro, moído na tafona)
- Água
- Sal
- Galinha caipira
- Banha para fritar
- Cebola (cortada um pouco maior, conforme o segredo de Dona Salete)
- Tempero verde (colhido na hora, se possível)
- Colorau
Modo de Preparo:
- Fritar a Galinha: Em uma panela grande, aqueça a banha. Adicione os pedaços de galinha caipira e frite-os lentamente até ficarem bem dourados e cozidos. A galinha é o que mais demora, então tenha paciência para que ela frite bem.
- Preparar o Molho: Quando a galinha estiver frita, retire-a da panela. Na mesma panela, adicione a cebola cortada (Dona Salete prefere um corte mais grosso para mais sabor) e deixe refogar. Adicione o tempero verde e o colorau, refogando um pouco mais. Adicione água e deixe ferver para formar o molho.
- Cozinhar a Galinha no Molho: Transfira a galinha frita para outra panela. Despeje o molho preparado sobre a galinha e deixe ferver junto para que os sabores se incorporem.
- Fazer a Polenta: Em uma panela separada, ferva a água com sal. Quando a água estiver fervente, adicione o fubá lentamente, mexendo constantemente para não embolar. Dona Salete sugere começar com um fubá mais grosso (se disponível, como o de milho vermelho moído na tafona) para evitar que a polenta embole. Continue mexendo vigorosamente até a polenta cozinhar e atingir a consistência desejada (cerca de 40 minutos, no caso de Dona Salete).
- Finalização: Com a polenta pronta, retire-a da panela e coloque-a em uma tábua. Corte a polenta em pedaços usando uma linha, como é a tradição antiga, para cortes mais retos e uniformes. Sirva a polenta com a galinha ao molho.
O Segredo de Dona Salete: O ingrediente mais importante é o amor e o carinho dedicados ao preparo. Usar temperos frescos e caseiros também faz toda a diferença.
Assista o episódio em vídeo:
O projeto Memórias a mesa tem o patrocínio de:
Prefeitura de Guabiruba e Vanifer Estribos Inteligentes
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