Mais de 10 dias após o início da greve de professores da rede municipal de educação de Belo Horizonte, famílias de estudantes sentem na rotina os impactos da paralisação. No dia 5 de junho, os profissionais rejeitaram a proposta de reajuste salarial apresentada pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e aprovaram, por tempo indeterminado, a interrupção das atividades.
Os dias longe da escola fazem diferença na vida da Sophia, de 8 anos, aluna da escola integrada Monsenhor João Rodrigues de Oliveira, no bairro São Geraldo, na região Leste de BH. Ao BHAZ, o pai da menina, Humberto Rocha, de 45 anos, relata que a filha sente falta da convivência com os amigos e do aprendizado. “Ela é uma menina que adora ir na escola, me pergunta todos os dias: “Pai, não vai voltar não?’ Ela tem amizades na escola, adora as coleguinhas, adora aquele convívio escolar”, comenta.
Só que as dificuldades não param por aí. Humberto, que é pai de dois filhos dentro do espectro autista, diz que ficou mais difícil trabalhar depois que as aulas da menina foram interrompidas. “Eu sou motoboy, trabalho com aplicativo. Por eu faturar por conta própria, eu não tenho um salário fixo, e quanto mais eu trabalhar na moto, mais eu ganho”, explica.
Sem ter onde deixar a filha, Humberto precisa ficar em casa para tomar conta da pequena, o que acaba afetando a renda da família. “A Sofia fica na escola integrada. Eu deixo ela às 7 horas da manhã e pego ela às 17h20. Então, dá um espaço muito grande para eu trabalhar. Com essa greve agora atrapalha muito”.
“Eu tenho a minha mãe, que é uma senhora de idade, e me ajuda de vez em quando. Mas mesmo minha mãe me ajudando, tem dia que ela tem que resolver as coisas dela. Eu não posso ficar por conta da minha mãe, porque ela tem a vida particular dela”, completa.
‘Está prejudicando muito’
A mesma dificuldade é sentida pela assistente administrativa Sheila Oliveira dos Santos, mãe de duas crianças, uma menina de 7 anos e um menino de 9, que estão sem aulas desde o início da greve dos professores. “Está bem complicado, está prejudicando muito, porque eu não tenho com quem deixar os meus filhos. Eu tenho uma rede de apoio, que é minha família, mas ninguém está disponível o tempo todo”, diz.
“A gente deixa com quem pode, e quando não tem ninguém, meu marido tem que sair do trabalho para vir e poder ficar. Ás vezes eu tenho que sair também do trabalho mais cedo, tenho que deixar o trabalho e tenho que vir para poder suprir essa falta da escola”.
Outra preocupação é com o desenvolvimento educacional das crianças. Sheila diz que a filha mais nova teve o processo de alfabetização interrompido pela paralisação. Já o filho mais velho vinha enfrentando dificuldades na escola, e a mãe afirma que planejava reforçar os estudos em casa: “Era um momento que a gente teve a primeira reunião com a professora, e eu até falei com ela que eu gostaria que ela me desse algumas dicas para eu poder estudar com ele, mas agora complicou mesmo. Porque aí fica esse tempo sem aula, e volta tudo do zero”
Greve afeta 90% da rede municipal
Trabalhadores de quase 90% das escolas municipais de Belo Horizonte aderiram à greve dos trabalhadores da educação, causando impacto no funcionamento parcial ou total das unidades. A Secretaria Municipal de Educação (SMED-BH) divulgou que, dentre as 324 escolas da rede própria, 248 funcionaram parcialmente, 31 permaneceram fechadas e 45 funcionaram normalmente. Os dados representam 86% de estabelecimentos impactados.
Segundo o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal (Sind-Rede/BH), a greve ocorre no contexto da Campanha Salarial de 2025, iniciada em janeiro deste ano. No entanto, a PBH apresentou uma proposta concreta somente em 30 de maio.
Reivindicações dos trabalhadores
O reajuste proposto pela Prefeitura de BH (PBH) foi de 2,49%, incluindo a correção do vale-refeição no mesmo percentual, com efeito retroativo a maio. Além disso, está previsto o aumento do valor do vale-refeição para R$ 60, a partir do mês seguinte à aprovação da lei.
Conforme o Sind-Rede/BH o índice de reajuste é inferior à inflação acumulada dos últimos 12 meses e o menor índice de toda a Região Metropolitana de BH.
“O índice de reajuste proposto está abaixo do reajuste do Piso Nacional do Magistério (6,27%) e bem distante de outras cidades da região metropolitana, como Santa Luzia (8%), Ribeirão das Neves e Vespasiano (6,27%) e Betim (6,5%). Até mesmo o governo estadual reajustou os salários dos professores em 5,26%”, disseram em nota.
Para o sindicato, o reajuste proposto desvaloriza os profissionais da educação, mesmo diante do aumento na arrecadação municipal e do repasse ampliado de recursos do FUNDEB. Além disso, a entidade afirma que os recursos destinados à educação vêm sendo utilizados de forma desconectada das reais necessidades das escolas.
A presidente do Sind-Rede/BH, Vanessa Portugal afirmou que a greve continua e, nesta terça-feira (17), haverá reunião do coletivo, às 14h, na Praça da Estação, no Centro de Belo Horizonte.
O que diz a PBH
“A Prefeitura de Belo Horizonte reconhece a importância dos profissionais da Educação e a necessidade constante de valorização e destaca que 100% dos profissionais do magistério da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte recebem salários acima do piso nacional. O salário médio de um professor de ensino fundamental que trabalha, por exemplo, nos turnos da manhã e tarde é de mais de R$ 13 mil.
Somente no comparativo entre março de 2022 e março de 2025, o aumento médio na remuneração dos professores da Educação Infantil foi de 91,4%, e o dos professores do Ensino Fundamental, de 69,7% – médias significativamente superiores à inflação do período, medida pelo INPC, que foi de 15,47%.
Contudo, todas as concessões devem ocorrer de maneira responsável, equilibrando as necessidades de diferentes setores para garantir a sustentabilidade financeira do Município. Com essa premissa, a Prefeitura informa que o índice de reajuste 2,49% representa o limite orçamentário para despesas dessa natureza e qualquer outra proposta extrapola as finanças municipais.
O índice de 2,49% recompõe 100% da inflação acumulada entre janeiro e abril de 2025. O índice de correção, conforme o INPC, será aplicado de forma retroativa a maio e contemplará tanto os servidores ativos, quanto os aposentados e pensionistas. A recomposição incidirá sobre os salários, vencimentos, gratificações, abonos e benefícios.
O impacto anual do reajuste de 2,49% com o aumento do vale-refeição para R$60 e outras demandas especificas será de R$ 493 milhões, sendo R$ 156 milhões somente para a Educação, caso aceitem a proposta.
É importante destacar que a atual proposta não considera a inflação de 2024 porque a PBH concedeu naquele ano um reajuste de 8,04%, valor superior à inflação registrada no mesmo período, que foi de 4,77%. Assim, toda a inflação de 2024 já foi concedida e ainda houve ganho real.
O Município sempre esteve aberto ao diálogo e realizou, de janeiro de 2025 até agora, 32 reuniões somente com o sindicato que representa a Educação para avanços nas pautas específicas e resolução de outras demandas da categoria“.
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