
No DF, homem agrediu criança de 4 anos em festa junina – e disse ter perdido a cabeça ao notar ‘bullying’ ‘contra seu filho. Psicólogos recomendam mediação e empatia nesses casos. Criança em escola esconde o rosto com as mãos, em imagem de arquivo
Mikhail Nilov/Pexels
Imagens registradas em um colégio de Vicente Pires, no Distrito Federal, no último domingo (15) geraram revolta em internautas de todo o país. No vídeo, um homem adulto agride uma criança de 4 anos durante uma apresentação de festa junina.
Douglas Parisio, de 41 anos, afirmou à polícia que “perdeu o controle” após ver a criança de 4 anos fazendo bullying contra seu filho, de 3. E que havia um “histórico de provocações” na relação entre os dois meninos (veja outros detalhes do caso mais abaixo).
Além da revolta, o caso gerou também uma pergunta nas redes: afinal, existe bullying ou perseguição entre crianças tão pequenas?
Em geral, quando se fala em bullying ou violência na escola, por exemplo, a imagem mais comum remete a adolescentes. As atitudes agressivas, no entanto, podem aparecer também na primeira infância – fase que vai até os 6 anos de idade.
Segundo especialistas ouvidos pelo g1, no entanto, comportamentos nessa fase não se enquadram formalmente como bullying.
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👉 Comportamentos de agressão física, verbal, psicológica ou emocional só são formalmente caracterizados como bullying, a partir dos 6 ou 7 anos.
Nessa idade, a criança já apresenta desenvolvimento cognitivo e emocional suficiente para compreender regras sociais, reconhecer as emoções dos outros e utilizar, de forma intencional, estratégias de dominação, exclusão ou controle.
👉 No caso de crianças até os 5 anos, esses comportamentos devem ser compreendidos como dificuldades no convívio social, típicas do desenvolvimento infantil.
Nesses casos, é fundamental:
adotar estratégias pedagógicas;
promover intervenções voltadas ao desenvolvimento socioemocional;
mediar conflitos;
incentivar atitudes que fortaleçam empatia, cooperação e respeito.
Na primeira infância, especialmente por volta dos 4 anos, as crianças ainda estão aprendendo a desenvolver habilidades sociais, empatia e controle emocional. Esse processo é longo. Por isso, atitudes como bater, morder, empurrar ou excluir, comuns nessa fase, geralmente refletem imaturidade emocional, e não uma intenção consciente de machucar
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Brincadeira ou bullying?
Para que um comportamento seja classificado como bullying, ele deve atender a três critérios fundamentais:
intencionalidade
repetição
desequilíbrio de poder
Isso significa que a ação deve ser proposital, com o objetivo claro de causar dano físico, emocional ou psicológico.
Além disso, precisa ocorrer de forma contínua e envolver algum tipo de vantagem da pessoa que agride sobre quem sofre, seja ela física, social ou emocional.
As crianças naturalmente disputam brinquedos ou se desentendem enquanto aprendem a se relacionar. Mas o bullying é diferente: há intencionalidade, repetição e, muitas vezes, um desequilíbrio de poder. Quando uma criança impõe medo e a outra sempre se retrai, por exemplo, isso exige atenção. A intenção de machucar, mesmo que disfarçada de “brincadeira”, precisa ser nomeada
Esperar que a criança “aprenda sozinha” a lidar com esses desafios também é um erro.
A omissão dos pais, responsáveis ou professores, por exemplo, pode gerar insegurança, sofrimento emocional – e até prejudicar a construção da autoestima desde muito cedo.
Juliana Barbato, especialista em desenvolvimento infantil, explica que o combate ao bullying começa antes mesmo de a primeira violência acontecer.
Ela cita como medida preventiva a construção de ambientes afetivos e seguros, que incentivem o desenvolvimento das habilidades socioemocionais desde os primeiros anos de vida.
Muitas vezes, os próprios adultos praticam formas sutis de violência verbal e emocional dentro de casa.
Frases como “você é burro”, “não sabe nada” ou “não faz nada certo”, principalmente quando ditas em tom de brincadeira, podem deixar marcas profundas.
“É sempre bom lembrar: “só é brincadeira quando todo mundo ri”. Se só um lado ri e o outro se sente ofendido, isso não é brincadeira é violência emocional”, conta Juliana.
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O que os pais podem fazer ❓
Para a psicopedagoga Kênia Ramos, os pais desempenham um papel fundamental na educação dos filhos. Eles são essenciais para observar, acolher, dialogar e incentivar o desenvolvimento da empatia nas crianças.
As crianças aprendem principalmente por observação. Por isso, não adianta apenas orientar sem dar o exemplo. A conduta dos pais é essencial para validar comportamentos, já que os filhos tendem a aprender mais pelo que veem do que pelo que ouvem.
“É muito importante que dentro de casa essas crianças consigam ver os adultos resolvendo conflitos de maneira respeitosa, porque se eu estou dentro de casa vendo que os meus pais resolvem o conflito se agredindo, é isso que estou aprendendo a fazer”.
O canal de comunicação entre a escola e os pais deve estar sempre aberto. Cabe à escola identificar comportamentos inadequados e estabelecer regras que promovam a conscientização, garantindo um ambiente escolar seguro e acolhedor.
“O ideal é buscar um diálogo direto e respeitoso, sem apontar culpados. Marcar uma conversa reservada com a coordenação ou equipe pedagógica é um ótimo caminho. A ideia não é expor a criança, mas protegê-la e ajudá-la a crescer com segurança”, afirma Izabelle Santos, psicóloga.
Como foi a agressão na festa junina❓
Homem agride criança durante festa junina em Vicente Pires, no DF.
Um grupo de alunos, com idade entre três e quatro anos, dançava no palco quando um menino enfiou o dedo no olho de outra criança.
Registros mostram que, em reação ao desentendimento, o homem que é pai de uma das crianças invadiu o palco e derrubou o garoto no chão. Ele segurou o menino pelo pescoço (veja o vídeo acima).
A criança agredida ficou assustada e começou a chorar. Logo em seguida, um segundo homem apareceu e empurrou o agressor.
A Polícia Militar (PMDF) precisou ser acionada e os envolvidos na briga foram conduzidos para o 8º Departamento de Polícia Civil para registro da ocorrência.
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