Beijos de resistência: Primeiro casal gay a se casar oficialmente e outros pares LGBT+ idosos celebram amor na Avenida Paulista; veja fotos


Sob o tema “Envelhecer LGBT+: Memória, Resistência e Futuro”, o evento lotou a Avenida Paulista e reuniu histórias que desafiaram a repressão, o preconceito e o tempo. Toni e David são o primeiro casal gay a se casar no cartório após decisão do STF
Luiz Franco/g1
Na 29ª edição da Parada do Orgulho LGBT+ em São Paulo, neste domingo (22), casais idosos mostraram que o amor e a sexualidade também fazem parte da terceira idade, mesmo com a invisibilidade que muitas vezes atinge essa população.
Sob o tema “Envelhecer LGBT+: Memória, Resistência e Futuro”, o evento lotou a Avenida Paulista e reuniu histórias que desafiaram a repressão, o preconceito e o tempo.
Em meio aos trios elétricos e o bater de leques, casais da terceira idade demonstraram afeto por meio de beijos.
Parada LGBT+ em SP tem ‘exército’ de leques, hino nacional, Marco Nanini e defesa do direito de envelhecer com dignidade
Mais uma vez presentes no evento, Toni Reis, de 65 anos, e David Harrad, casados há 35 anos, carregam um marco na história do país: foram o primeiro casal gay a se casar oficialmente em cartório após a decisão do Supremo Tribunal Federal, em 2011. Juntos há quatro décadas, eles também são referência no ativismo: Toni atua na causa LGBT+ há 43 anos.
“A gente vem desde a primeira [Parada]. Eu e o David estamos casados há 35 anos. Completamos nossas bodas de coral. Estamos aqui para comemorar o lema de envelhecer com qualidade de vida”, afirma Toni.
Segundo ele, o envelhecimento deve ser encarado com dignidade e pluralidade. “[O tema] me representa. Temos que trabalhar com todas as idades, jovens, adolescentes, adultos e idosos. Não podemos deixar ninguém para trás.”
“Nós, idosos, temos que parar com aquela coisa de falar ‘no meu tempo era melhor’. Não. O melhor tempo é agora. Os jovens têm que aprender com a gente e nós aprendemos com os jovens.”
José Maria e Rinaldo estão juntos há 41 anos e participaram da 29ª Parada do Orgulho LGBT+
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Outro casal presente era José Maria de Moraes, de 65 anos, e Rinaldo Vince, de 61, que comemoram 41 anos de união. Para José Maria, é preciso desconstruir a ideia de que o desejo acaba com o tempo.
“Eu acho um mito essa ideia de que na terceira idade, ao envelhecer, você não tenha essa possibilidade de continuar o seu encantamento com a outra pessoa, o seu desejo com a outra pessoa”, afirmou.
O casal lembra que, quando se conheceram, em 1983, a repressão era muito maior.
“Tivemos que tomar muito cuidado com as nossas atitudes, com as formas de demonstrar carinho, porque isso era proibido, era rechaçado. Não que hoje não exista, ainda existe. Mas muita gente conseguiu quebrar essa bolha”, conta Rinaldo.
Para eles, é essencial que as novas gerações saibam que esse caminho foi aberto por quem veio antes e respeitem o legado.
“A gente pavimentou isso. A gente e muitas outras pessoas que não estão mais presentes fisicamente pra falar sobre isso, né? Que sofreram as consequências de uma orientação”, diz José Maria.
Edmar e Elcio são casados há 13 anos e participaram da 29ª Parada do Orgulho LGBT+
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Edmar Bastos, de 41 anos, e Elcio Goiano, de 64, casados há 13 anos, também celebraram o amor na Paulista.
Eles são de São Paulo e fizeram questão de participar da Parada deste ano por conta do tema do envelhecimento. Elcio conta que se sentiu motivado a participar do evento esse ano causa da presença do ator Marco Nanini.
“Foi inspirador. É uma conquista ter chegado à terceira idade frente a todos os desafios enfrentados
Diretamente de Alagoas, o casal Carmen Lúcia Dantas e Cintia Ribeiro viajou para São Paulo para participar da Parada.
Museóloga, Carmen também participou da exposição “O mais profundo é a pele”, em exibição no Museu da Diversidade Sexual, no Centro da capital.
Durante a Parada, ela e Cintia caminharam de mãos dadas por toda a avenida. Para elas, viver um amor lésbico na maturidade é também um ato de afirmação.
Carmen Dantas e Cíntia Ribeiro participaram da 29ª Parada do Orgulho LGBT+
Luiz Franco/ g1
Como foi a Parada
Não teve jeito: a principal atração da 29ª Parada do Orgulho LGBT+ em SP foram os leques. Já famosos em grandes eventos do país — como, mais recentemente, o show de Lady Gaga em Copacabana —, o acessório formou um verdadeiro exército na Avenida Paulista.
Neste ano, os organizadores convocaram o público a levar seus leques. Mais do que um acessório de moda, o item se tornou um símbolo de resistência e expressão para a comunidade.
Entre os idosos presentes, estava o ator Marco Nanini, que marcou a TV brasileira com o personagem Lineu Silva da Grande Família.
Ele foi aplaudido pelo público que estava no local. O ator, que é gay, segurava uma bandeira do Orgulho.
FOTOS: 29ª Parada do Orgulho LGBT+ colore a Av. Paulista em SP, e celebra o amor, as famílias e o envelhecimento
Marco Nanini na Parada LGBT+ de SP.
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Segundo contagem da USP, às 13h58, de maior concentração do público, havia 48.747 pessoas na Avenida Paulista, com 5.849 mil pessoas para mais ou para menos. Em 2024, nosso cálculo foi de 73,6 mil pessoas (± 8,8 mil).
Mas, apesar do tema, a grande maioria dos participantes do evento era formada pelo público mais jovem.
Como em todos os anos, famílias marcaram presença na Parada. Entre elas, estavam Jarbas Bitencourt e o fotógrafo Mikael Bitencourt. Casados há mais de 15 anos, este é o primeiro ano em que a filha deles, a pequena Antonella, participa do evento.
Hoje com um ano, Antonella é o primeiro bebê nascido com o DNA de dois pais no Sul do Brasil.
Jarbas Bitencourt e o fotógrafo Mikael Bitencourt se tornarem pais através de uma barriga solidária
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Símbolo LGBT, leque ocupa a Paulista na parada: ‘Para espantar a homofobia do ar’
Os leques
Leques coloridos na 29ª Parada LGBT de SP.
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Objeto que surgiu na China, com registros desde 3.000 a.C., criado originalmente para se refrescar, o leque foi adotado pela comunidade LGBTQ+ principalmente na arte drag e na cena ballroom — movimento cultural marcado por batalhas de dança no estilo vogue, que ganhou popularidade nos anos 1990 com a música e o clipe Vogue, da cantora Madonna.
O ballroom ou cultura de baile, além de ser um espaço de inclusão para corpos trans, pretos e latinos, tem um viés político e de competição. Por meio das performances, os bailarinos desfilam e dançam em batalhas de vogue.
Em 2022, com o lançamento do álbum Renaissance, no qual Beyoncé celebrou a house music e a cultura ballroom, os leques ganharam destaque e passaram a ser vistos em shows, boates e nas ruas — principalmente em eventos grandiosos, como os shows de Madonna e Lady Gaga no Rio de Janeiro.
“Entrou na nossa vida principalmente pelo show da Madonna no Rio. Pra gente, é pra espantar a homofobia do ar”, disse uma participante da Parada.
“Virou um símbolo de resistência LGBT. A gente usa como um verdadeiro simbolismo dentro da comunidade”, afirmou outra.
Aproveitando a campanha, muitos vendedores ambulantes estavam comercializando leques por até R$ 50.
Público da 29ª Parada LGBT.
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Hino nacional
Parlamentares da esquerda estiverem presentes e discursaram no início do evento, antes dos shows. Entre as pautas, foi citada o fim da escala 6×1.
Os deputados estaduais: Carlos Giannazi (PSOL), Ediane Maria (PSOL), Carol Iara (PSOL) e Beth Sahao (PT), a vereadora Luana Alves (PSOL) e a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL) também estavam presentes. Além da figurinha carimbada, o deputado estadual Eduardo Suplicy (PT).
Beth Sahao, Carol Iara e Luana Alves discursaram para o público.
“Nós não iremos sair das ruas, não iremos voltar para o armário, não vamos deixar de dizer que mulheres amam mulheres e homens amam homens. Não vamos deixar de colocar nossas identidades nas ruas” disse Luana Alves.
Ao final dos discursos, o Hino Nacional foi tocado e o público cantou junto.
A vereadora Amanda Paschoal (PSOL) falou ao g1 sobre a importância do tema deste ano e a necessidade de articulação política para a defesa dos direitos da população LGBTQ+.
Vereadora Amanda Paschoal (PSOL)
Luiz Franco/ g1
“Ser LGBT em qualquer faixa etária é extremamente difícil na sociedade brasileira. Temos uma política e uma cultura de perseguição aos nossos corpos, às nossas identidades, às nossas orientações. Infelizmente, o envelhecimento, por si só, já é um desafio no Brasil — e, para a população LGBTQIAPN+, soma-se a toda essa violência estruturada contra nós”, afirmou.
“A gente precisa muito articular e construir políticas públicas para que possamos envelhecer com qualidade de vida, com cidadania, com acesso a direitos básicos e fundamentais que nos são negados desde sempre. Estamos vendo, agora, a extrema-direita atacando especialmente a população trans e travesti, principalmente em suas infâncias, usando isso para criar um pânico moral — muitas vezes conseguindo mobilizar votos e parcelas significativas da sociedade. Por isso, precisamos nos organizar para garantir o acesso a todos os direitos, em todas as fases das nossas vidas”, continuou.
A deputada Érika Hilton (PSOL) não compareceu neste ano. Ela está em Paris, na França, para participar da EuroPride 2025.
Participante exibe leque na 29ª Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo, neste domingo, 22 de junho de 2025.
Luiz Franco/g1
Ludmilla confirmada de última hora
Ludmilla no Fervo da Lud
Júlio César/AgNews
A cantora Ludmilla foi confirmada de última hora entre as atrações da Parada. Ela se apresentou no trio da Amstel. Além de Ludmilla, o evento ainda teve shows de Pedro Sampaio, Banda Uó e Pepita.
Abertamente bissexual, Ludmilla é um dos nomes da música mais importante do país. Recentemente, ela teve sua primeira filha com a esposa Brunna Gonçalves.
Nasce Zuri, filha de Ludmilla e Brunna Gonçalves
Reprodução/Instagram
Ludmilla e Brunna Gonçalves contaram que seriam mães em novembro de 2024. O anúncio da gravidez de Brunna foi feito inicialmente durante o show da turnê Numanice 3, realizado em São Paulo, e posteriormente nas redes sociais da cantora e da dançarina. Elas estão casadas desde o fim de 2019.
Segundo estimativa da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o turismo gerado pela Parada deve injetar cerca de R$ 548,5 milhões na economia da cidade neste ano. O valor é 16% maior que no evento do ano passado, diz a entidade.
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Organizada pela Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (APOLGBT-SP), a edição desse ano contou com 17 trios.
Público da Parada LGBT+ de São Paulo.
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Carmen Dantas e Cíntia Ribeiro participaram da 29ª Parada do Orgulho LGBT+
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Também animaram o público os DJs das festas V de Viadão, Tersapata, Desculpa Qualquer Coisa e o bloco Minhoqueens.
Segundo os organizadores, é preciso cobrar do poder público a criação de centros de convivência que respeitem a diversidade, de residenciais preparados para acolher corpos e trajetórias plurais, e de políticas públicas que incluam orientação sexual e identidade de gênero como marcadores prioritários no debate sobre envelhecimento.
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Prefeito não aparece pelo segundo ano
Como no ano passado, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) que participou da Marcha para Jesus na quinta-feira (19) não compareceu ao evento. Nunes disse ao g1 que viajou no sábado à noite (20) para Itália, onde estão previstas agendas com autoridades locais em Milão e Roma, além de um encontro com o papa Leão XIV.
“Eu não vou estar aqui. Vou estar o Orlando [Morando], os secretários, todos estarão lá [na Parada], que tem todo o nosso apoio, nossa infraestrutura necessária para poder ser um grande evento. Só não vou votar porque estarei na Itália”, explicou.
Parada LGBT+ em São Paulo
LECO VIANA/THENEWS2/ESTADÃO CONTEÚDO
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