Casa inteligente: como a IA está transformando o lar e por que você deve ficar atento

Assistentes virtuais, robôs de limpeza, sistemas de climatização e até de irrigação automáticos – além, claro, das mil e uma possibilidades dos smartphones. Ter uma casa conectada não é mais coisa de ficção científica e ganha cada vez mais espaço nos lares brasileiros. De acordo com o IBGE, 83,3% dos domicílios do Brasil possuem conexão Wi-Fi, o que torna essas casas um terreno fértil para as facilidades oferecidas pela Inteligência Artificial (IA). No entanto, tanta conectividade traz um alerta: é preciso redobrar a atenção com a proteção de seus dados e o excesso de automação.A automação dos lares brasileiros busca criar um cotidiano mais fluido – adaptável à rotina de cada família – que proporciona mais tempo e conforto aos usuários dentro de suas casas. “Estamos vivendo um momento de transição no modo como interagimos com o espaço doméstico”, afirma o professor da Wyden e engenheiro de IA em sistemas avançados de produção, Roney Camargo Malaguti. 

O boom de lares mais autônomos no Brasil é reflexo de uma maior acessibilidade tecnológica e da busca por mais praticidade.

“E a IA tem sido o cérebro por trás dessa transformação. Hoje, dispositivos como Alexa, Google Assistant e Siri, integrados a sistemas de automação residencial, permite que, por exemplo, um assistente virtual organize a agenda da casa, envie lembretes importantes, recomende ajustes no consumo energético ou sugira cardápios com base no que há na geladeira”, explica o engenheiro.Isso representa um ganho direto em conforto e qualidade de vida, especialmente para quem tem uma rotina acelerada ou convive com limitações físicas.“A IA está deixando de ser apenas uma ferramenta e passando a ser uma parceira no cotidiano”, pontua Roney Camargo Malaguti, explicando ainda que a tecnologia também faz parte da rotina de sua família, mas de forma equilibrada. “E sempre faço questão de refletir sobre o limite entre uso e dependência. Evitamos conectar absolutamente tudo. Buscamos manter o uso da tecnologia como apoio, e não como uma muleta. Também converso bastante com minha família sobre segurança digital, privacidade e como evitar a exposição excessiva. A ideia é que a tecnologia nos sirva, e não o contrário”, afirma.E quem bem conhece as muitas facilidades que esses sistemas proporcionam – e toma cuidado com o que aciona dentro de casa – é o militar aposentado Madson Conceição de Souza. Com fechadura e robô de limpeza inteligentes, lâmpadas acionadas por voz, controle remoto universal e algumas Alexa acionadas com diferentes comandos, Madson afirma: “Desde que seja para o bem, sou totalmente a favor do uso dessas tecnologias. Elas ajudam muito na correria do dia a dia, mas sempre pesquiso bastante para decidir o que melhor vai funcionar para o que quero em casa”, explica.De algumas dessas o aposentado passa longe, a exemplo da fechadura inteligente acionada por voz. “Ela já é eletrônica, mas acho muito perigoso colocar o acionamento de voz, pois não é um sistema que tem o discernimento de atender apenas a minha voz e da minha família”, aponta Madson.

Madson Conceição, com Alexas e robô inteligente

|  Foto: Shirley Stolze / Ag A TARDE

No entanto, há muitas outras coisas que ele tem a curiosidade de experimentar. “Como ligar as luzes do quarto quando pisar no chão ou uma geladeira inteligente com tela na porta, mas acho que minha mulher não ia gostar muito, ela já acha demais o que temos”, confessa.E com tanta automação pela casa, claro, Madson tem uma lista de histórias divertidas envolvendo IA. Além de suas discussões com a Alexa (quando ela entende seu comando) e o dia em que seu carro começou a tocar música infantil e não parava independente do que ele fizesse, houve o inesquecível caso do robô de limpeza, que assustou a sogra que estava sozinha em casa.

“Quando cheguei em casa, ela estava trancada no quarto e me disse: Ele ligou sozinho Madson, não fui eu. Começou a andar pela casa toda sem parar, não sei o que aconteceu

Evitar o exageroPara a professora de robótica e língua inglesa Belle Rodopiano, é preciso ficar atento ao uso excessivo dessas tecnologias para não acabar dependentes dela.“Sou professora e não vejo como positivo o uso desenfreado da tecnologia, porque sei que isso pode barrar processos criativos de uma forma geral. Mesmo no meu dia a dia doméstico tenho bastante cuidado ao utilizar essas ferramentas, usando apenas para perguntar pequenos fatos, para pedir a medida de alguma coisa, saber o valor do dólar e, com mais frequência, para saber onde está meu celular que perco muito de vista. Um ‘Hey, Siri’ e encontro o aparelho”, explica a professora.Estamos diante de uma geração de crianças e adolescentes que estão crescendo junto com essas inteligências artificiais e no meio delas, por isso Belle Rodopiano aponta que, mesmo durante suas aulas, onde há momento para apresentar essas tecnologias, ela tem o cuidado de mostrar para seus alunos que elas são apenas um suporte.“É importante que as pessoas tenham em mente que essas tecnologias não devem ser uma base de conhecimento geral. E entender que você tem potência e que você tem habilidades e competências de fazer algum processo e caso não tenha, precisa experimentar outros meios para alcançar essa prática, e não ficar dependendo sempre de IA”, reflete.Psicóloga e professora da Uniruy, Bárbara Guimarães explica que o uso de tecnologias automatizadas pode promover maior eficiência na organização do cotidiano, reduzindo a carga mental.“Especialmente para mulheres, que ainda carregam, muitas vezes, a responsabilidade pela gestão do lar. Do ponto de vista funcional, esses recursos podem favorecer maior tempo para atividades com valor pessoal. Por outro lado, quando o uso se torna excessivo ou substitui ações com valor de conexão, cuidado ou presença, pode gerar um padrão de esquiva experiencial””, alerta a psicóloga.Isso pode não só afastar a pessoa de vivências importantes, como o contato com os filhos, o parceiro, o próprio corpo ou o tempo de descanso significativo, “mas também pode reforçar padrões de controle rígido e produtividade constante, alimentando o ciclo da exaustão”, explica Bárbara Guimarães. Desenvolvedor de software, Eduardo Muniz usa principalmente – mas muito pontualmente – os assistentes virtuais Gemini e Alexa. “A tecnologia traz muita conveniência com relativo menor custo e esforço, mas acho que é preciso pensar seriamente sobre se queremos alguns tipos de ‘solução’ em nossas casas”, reflete ele.Ele usa as assistentes para definir timer para o que está cozinhando e lembretes de coisas que tem que fazer, por exemplo. “E para tirar dúvidas rápidas também: será que posso dar para minha cachorra o alimento tal quando ela está me olhando com cara de pidona?”, brinca ele.“Um bom exemplo são as fechaduras digitais. As acho ótimas e muito práticas, mas não se estiverem conectadas à internet. Tudo que está conectado a uma rede é, tecnicamente, hackeável. Claro, podem existir fechaduras digitais seguras, mas é necessário entender como esses produtos se comportam antes de partir para utilização”, aconselha.É então que entramos em um ponto essencial do uso desses equipamentos. Com a popularização da IA, também cresce a quantidade de dados sensíveis sendo processados, localização, hábitos, rotinas e até imagens dos moradores.“Por isso, é fundamental que os usuários tenham consciência da segurança digital. Algumas boas práticas incluem utilizar redes Wi-Fi seguras e com senha forte, atualizar constantemente o firmware dos dispositivos, ler as políticas de privacidade dos serviços e, sempre que possível, desativar permissões desnecessárias”, aconselha o professor Roney Camargo Malaguti.Também é importante dar preferência aos dispositivos de empresas com boa reputação em segurança e transparência, “além de pensar criticamente sobre o que realmente precisa estar conectado e o quanto se está disposto a compartilhar para obter conveniência”, afirma o professor.

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