
Sangue oculto nas fezes e colonoscopia: como identificar e prevenir o câncer colorretal
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O câncer colorretal é um dos cinco tipos de câncer que mais atingem homens e mulheres em todo o mundo. A cantora Preta Gil foi diagnosticada com a doença em janeiro de 2023 e, após o fim do tratamento, no ano seguinte, descobriu uma metástase — quando o tumor se espalha para outros órgãos. Após uma luta intensa contra a doença, a cantora morreu, neste domingo (20), em Nova York, aos 50 anos.
O g1 conversou com oncologistas e entidades para entender como o câncer de intestino pode ser diagnosticado e prevenido.
Os dois exames disponíveis que podem identificar sinais para tratar e prevenir a doença são:
Exame de sangue oculto nas fezes
E a colonoscopia
Diferentemente de outros tipos de câncer, o de intestino – também chamado de câncer colorretal ou adenocarcinoma colorretal – é altamente prevenível. Isso porque a maioria dos tumores de intestino surgem de pólipos que podem ser identificados e removidos por meio da colonoscopia.
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Colonoscopia – o “padrão ouro”
A colonoscopia é o exame chamado de ‘padrão ouro’ nesta área. Isso porque este exame permite que o médico veja todo o intestino e verifique se há alguma lesão, por meio da inserção de uma cânula com uma câmera pelo ânus. Em caso positivo, um eventual ou eventuais pólipos são removidos.
No Brasil, a colonoscopia costuma ser recomendada a partir dos 50 anos de idade, caso o paciente não tenha histórico familiar de câncer de intestino. Nos Estados Unidos, a recomendação já ocorre a partir dos 45 anos e, no Japão, a partir dos 40 anos.
Se num primeiro exame o paciente não tiver nenhum pólipo ou lesão, o exame pode ser repetido somente 10 anos depois. Se houver algum pólipo, dependendo do tipo, o paciente pode precisar repetir o exame em cerca de 5 anos ou menos.
“A colonoscopia pode identificar pólipos – que em 90% das vezes são lesões precursoras – e remover estes pólipos. Este é o único exame de rastreamento onde você não deixa desenvolver o câncer. É diferente da mamografia, onde você busca a fase mais precoce, ou de quando faz o papanicolau”, explica a coordenadora do comitê de Tumores Gastrointestinais altos da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), Ignez Braghiroli.
Apesar se a colonoscopia ser um exame altamente preciso e eficaz, ele não é isento de riscos. Em raros casos, pode haver perfuração do intestino (cerca de 0,2%). Além disso, ele exige um preparo considerado desconfortável por muita gente.
Na véspera do exame, o paciente precisa iniciar à noite uma dieta mais pastosa e começar a tomar laxantes para que o intestino esteja limpo na hora do exame. Por este motivo, muitas clínicas oferecem a opção de o paciente passar o dia do exame internado, para que a parte mais intensa do uso de laxantes seja feita na própria unidade de saúde.
Isso evita que o paciente tenha vontade de ir ao banheiro durante o trajeto. Além disso, quando internado, o paciente já pode se hidratar por meio de soro intravenoso na unidade de saúde, evitando mal-estar, explica o oncologista do Hospital São Vicente de Paula Décio Lerner.
“Ainda existe um preconceito e muitas pessoas desistem de fazer o exame por causa do preparo. Mas o exame em si é tranquilo e indolor, porque o paciente é sedado”, acrescenta Lerner.
Médicos comentam que, na rede pública, a disponibilidade para fazer uma colonoscopia é difícil e demorada. E pessoas com histórico familiar são priorizadas na fila.
Além da colonoscopia tradicional, existe a colonoscopia virtual, feita com um aparelho de tomografia. São injetados contrastes viarretal que podem detectar lesão no intestino. Mas se houver alteração, e necessária a colonoscopia tradicional, para a remoção da lesão.
Este exame também é caro, mas se torna uma alterativa para pessoas mais velhas, com algum risco cardiológico, ou que não querem fazer a colonoscopia.
Sangue oculto nas fezes: grande arma para os mais jovens
Extremamente simples e barato, o exame de sangue oculto nas fezes funciona como uma espécie de triagem para identificar o risco de um eventual câncer de intestino. Sociedades médicas recomendam que este exame seja feito anualmente a partir dos 45 anos, mas esta cultura ainda não é forte no Brasil.
O exame pode ser solicitado por qualquer médico e é exigida apenas uma amostra de fezes armazenada em recipiente fornecido pelo laboratório ou comprado em farmácia comum e que pode ser refrigerada, dependendo do intervalo de tempo entre a coleta e a entrega no laboratório.
Mesmo se for identificado sague nas fezes, não significa que o paciente tenha câncer. Mas isso pode ser um sinal de alerta para que a colonoscopia seja solicitada antes dos 50 anos.
O exame de sangue oculto nas fezes permite identificar traços de sangue nas fezes para então selecionar pessoas que vão para um exame mais invasivo, como a colonoscopia.
Apenas o sangue oculto não é o suficiente para fazer diagnóstico. Já na colonoscopia, se for identificada uma lesão maligna, o diagnóstico é feito com a biópsia, segundo Braghiroli.
O coloproctologista Fábio Campos, membro titular e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Coloproctologia e professor da Faculdade de Medicina da USP, destaca que este exame é uma grande arma para pessoas mais jovens.
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O que o SUS oferece?
O Sistema único de Saúde (SUS) oferece a possibilidade de fazer o rastreamento do câncer de intestino por meio de uma colonoscopia. E quanto mais rápido esse diagnóstico, mais chances de cura.
Mas médicos afirmam que no Brasil não existe uma política pública formal de rastreamento da doença.
“O que se segue são recomendações de entidades médicas, que recomendam a colonoscopia a partir dos 45 anos. Em alguns países, pelo aumento tão grande de câncer em jovens, essa idade tem baixado para 40. Mas a gente não tem um rastreamento formal no Brasil. Em alguns lugares, se faz sangue oculto nas fezes e a colonoscopia”, afirma Braghiroli.
Incidência e fatores de risco
Aumento proporcional de casos de tumor no intestino entre mais jovens chamou a atenção de cientistas
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O câncer de cólon e reto – também chamado de câncer colorretal (CCR) e câncer de intestino grosso – está entre os cinco principais tipos de câncer que acometem homens e mulheres em todo o mundo, segundo a Fundação do Câncer.
No caso das mulheres, é o segundo tipo de câncer mais comum, ficando somente atrás do câncer de mama.
Segundo a fundação, as projeções indicam que 46 mil novos casos de câncer de intestino devem surgir ainda este ano no Brasil: 90% são em pessoas com mais de 50 anos. Mas, segundo o Instituto de Pesquisa do Câncer dos Estados Unidos, tumores desse tipo vêm aumentando entre os mais jovens, inclusive na faixa etária entre 20 e 39 anos.
Estima-se que mais de 1,9 milhão de casos tenham sido diagnosticados globalmente em 2022, com cerca de 900 mil óbitos, tendo um impacto significativo na morbimortalidade da população.
O câncer colorretal é a neoplasia maligna (câncer) mais comum do trato gastrointestinal e representou:
A quarta causa mais frequente de incidência entre homens e mulheres em 2022, no mundo.
No Brasil, é a terceira causa mais incidente da doença, vindo apenas depois do câncer de próstata em homens e de mama em mulheres.
O CCR é tradicionalmente considerado uma doença que afeta, principalmente, as pessoas idosas, com a maioria dos casos ocorrendo entre a quinta e sexta décadas de vida. Por essa razão, o rastreamento geralmente não é recomendado para indivíduos com menos de 50 anos de idade.
Estima-se que o risco de desenvolver CCR ao longo da vida seja de cerca de 5%, aumentando com o avanço da idade.
A incidência de câncer colorretal de início precoce vem aumentando globalmente desde a década de 1990, especialmente em países de alta renda, incluindo Austrália, Nova Zelândia e Coreia do Sul.
Em 2022, foram registrados 184.709 novos casos de câncer colorretal de início precoce no mundo, representando 40% de todos os cânceres gastrointestinais de início precoce, com os maiores aumentos observados na Nova Zelândia. As causas ainda não são bem definidas e fatores genéticos não explicam a totalidade de câncer em jovens.
Fatores de risco modificáveis associados ao câncer colorretal podem ter associação com o início precoce e incluem a exposição a carcinógenos, como:
Tabagismo
Álcool
Carnes processadas
Bebidas adoçadas com açúcares livres
Obesidade
Comportamento sedentário
Campos explica que o Brasil tem uma incidência de câncer de intestino mediana em relação a outros países. Ele destaca que a dieta ‘ocidentalizada’, com alto consumo de ultraprocessados, carne vermelha e açúcar aumenta o risco de desenvolver a doença.
Quais são os sinais da doença?
Entre os sinais do câncer colorretal, estão:
Presença de sangue nas fezes
Dor abdominal por mais de 30 dias
Emagrecimento rápido
Diarreia ou constipação
Existe vacina contra este tipo de câncer?
Pesquisadores da Universidade da Flórida (Estados Unidos) estão desenvolvendo uma vacina universal para combater diversos tipos de tumor. O estudo ainda é experimental, mas traz esperança.
A vacina experimental de mRNA conseguiu potencializar os efeitos da imunoterapia e eliminar tumores em testes com camundongos. A descoberta, publicada na quinta-feira (18) na revista Nature Biomedical Engineering, é considerada um passo importante rumo à criação de uma vacina universal contra o câncer.
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