Brasil deve ampliar comércio com Europa e Ásia sem adotar ‘olho por olho’ contra Trump, diz ex-embaixador nos EUA

O ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos Rubens Ricupero afirmou em documento divulgado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) avaliar que, diante do cenário de tarifaço anunciado pelos Estados Unidos, o Brasil precisa ampliar o comércio com países da Europa e da Ásia e não adotar uma política de “olho por olho” contra Donald Trump.
O documento, intitulado “Brasil e Estados Unidos na Era Trump 2.0” é assinado por Ricupero, conselheiro Emérito do Cebri, e por Ariane Costa, especialista em Geopolítica e Comércio Internacional da instituição.
No último dia 9, Donald Trump anunciou que o governo dos EUA irá taxar em 50% os produtos brasileiros vendidos no mercado americano a partir de 1 de agosto.
Trump alegou questões políticas, como a situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro, e questões econômicas, afirmando erroneamente que os EUA têm saldo negativo na relação comercial com o Brasil, enquanto, na verdade, o saldo é positivo para os americanos.
Desde então, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem dito que o Brasil quer negociar a tarifa com os Estados Unidos, mas acrescentado que, se os países não chegarem a um consenso, pode recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) ou utilizar a chamada Lei da Reciprocidade Econômica, aprovada pelo Congresso Nacional, sancionada e regulamentada pelo petista.
“Reciprocidade não significa adotar uma lógica de ‘olho por olho’. O Brasil não está obrigado a reagir de forma automática nem no campo nem nos termos definidos pelo interlocutor. Diante da ameaça do ‘tarifaço’ de 50%, o governo deve considerar a ampla gama de interesses econômicos norte-americanos que podem, legitimamente, ser objeto de pressão com instrumento de negociação”, afirmam Ricupero e Ariane Costa no documento.
Diante disso, defendem que o país avalie as seguintes estratégias:
– Fortalecer a articulação direta com a Câmara Americana de Comércio para o Brasil;
– Aprofundar as relações com a Europa;
– Aprofundar e diversificar a relação com a Asia;
– Coordenar posições conjuntas e promover propostas concretas que visem à reforma e ao fortalecimento da OMC.
“É imprescindível que o Brasil mantenha uma política externa ativa, voltada para a contenção de danos. Isso passa pela manutenção de canais diplomáticos abertos e diversificados, especialmente nos níveis ministerial, legislativo, subnacional e por meio do setor privado”, diz o documento.
Diplomatas ouvidos pela Globonews dizem ser necessário o Brasil seguir apostando nas negociações, mesmo diante da falta de sinalização dos EUA de quererem negociar.
Avaliam que a OMC está paralisada e sem capacidade de agir e, mesmo que tome alguma decisão sobre Trump em relação ao Brasil, sem força para implementar.
Assim, avaliam que um eventual recurso à entidade seria simbólico, representando um gesto político, e só poderia ter alguma efetividade se fosse articulado em conjunto com outros países também alvos do tarifaço de Trump.
Impactos na economia
Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás somente da China.
Nesse cenário, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que também comanda o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), tem se reunido com setores da economia para avaliar os impactos do tarifaço e discutir eventuais reações.
Estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), por exemplo, afirma que, se a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros vendidos no mercado americano foi implementada, haverá as possíveis consequências abaixo:
– queda de 0,16% do PIB (cerca de R$ 19 bilhões);
– redução de R$ 52 bilhões nas exportações;
– queda de R$ 33 bilhões nas importações;
– fechamento de cerca de 110 mil postos de trabalho.
“A indústria brasileira tem nos EUA seu principal mercado, por isso a situação é tão preocupante. É do interesse de todos avançar nas negociações e sensibilizar o governo americano da complementariedade das nossas relações. A racionalidade deve prevalecer”, afirmou em nota o presidente da CNI, Ricardo Alban.
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