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Em 2025, o Governo da Bahia, através da SecultBa e do Ipac, deu início a requalificação da área, que será transformada no Parque de Economia Criativa da Bahia, uma incubadora de formação e projetos que deve gerar emprego em diversos setores ligados à cultura.“Duas licitações serão executadas: a primeira para contenção da ruína do casarão; a segunda para definir a empresa, por meio de um concurso de arquitetura, que fará o projeto arquitetônico balizador das obras de restauro, construção e paisagismo do espaço. Será anunciado também um programa de apoio à economia criativa com protagonismo das artes performativas no Solar”, explicou a Secult-BA em nota.Para a primeira fase do projeto, foram investidos R$ 5 milhões em serviços de limpeza do espaço, preservação do patrimônio e contratação de serviços de arquitetura.
Ruína no solar Boa Vista, no parque Boa Vista de Brotas
| Foto: José Simões/Ag A TARDE
As intervenções s são uma estratégia benéfica para o contexto cultural da Bahia, afirma o diretor de projetos, obras e restauro do Ipac, Fernando Caldeira. “É preciso refletir sobre os métodos mais adequados de intervenção em monumentos históricos, transcendendo aspectos da forma e da materialidade do bem cultural. A intervenção em edifícios tombados é permeada por valores significativos, sejam eles culturais, históricos, artísticos, arquitetônicos, de memória ou mesmo simbólicos”, explica.Essas ações atuam diretamente nas memórias e no componente sensível do presente. “O testemunho histórico de um bem cultural nos possibilita um conhecimento integrado à linha cronológica do tempo, que reflete o seu valor cognitivo inexoravelmente ao passado””, afirma o diretor.Caminhos do restauroMestre em engenharia civil, Ingrid Silva Assis Santana é doutoranda em arquitetura e urbanismo na área de tecnologia da preservação e restauração na UFBA, e aponta que o destino de prédios históricos requalificados em Salvador tem oscilado entre avanços significativos e oportunidades perdidas. Se por um lado há requalificações que revitalizam edifícios mantendo elementos arquitetônicos icônicos.“A Casa das Histórias de Salvador é um exemplo inspirador disso”, afirma a engenheira, que explica que há casos em que a requalificação prioriza interesses comerciais em detrimento da identidade e história do prédio.“O Solar Boa Vista representa um caso emblemático de como a requalificação de patrimônios históricos pode resgatar não apenas a arquitetura, mas a função social de um espaço. Sua transformação em equipamento cultural ativo tem o potencial de reativar a memória afetiva da população, enquanto cria significados para as atuais gerações”, afirma Ingrid Santana, acrescentando que a integração urbana do Solar Boa Vista pós-requalificação estará diretamente ligada aos diálogos com o entorno.“Se o projeto incluir uma programação cultural diversificada, conexões pedestres com o bairro e serviços complementares que estimulem a permanência de pessoas, poderá se tornar um catalisador de desenvolvimento para toda a região”, afirma Ingrid Silva Assis Santana.A moradora de Brotas e comerciante Marinalva de Jesus Silva, que tem uma barraca de lanches próxima ao solar, pode acompanhar essa mudança. De Alagoinhas, Dona Marinalva veio para Salvador quando tinha quatro anos e tem muitas lembranças do Solar Boa Vista.“Tinha uma capelinha dentro do solar e eu sempre entrava para rezar. Vi o solar ser a sede da prefeitura e da secretária de educação. Muitos homens vinham jogar dominó e até minhas filhas brincavam em um plaquinha que tinha na área verde, sabe? Tanta coisa pode ser feita nesse solar, é um casarão enorme e meu sonho é poder chegar aqui e ver o Solar Boa Vista revitalizado”, torce.Outro histórico, belo e icônico prédio está nos toques finais de sua revitalização: a antiga sede da Junta Comercial do Estado da Bahia (Comércio). Integrando a poligonal de tombamento do Conjunto Urbano e Arquitetônico da Cidade Baixa de Salvador, o Governo da Bahia investiu mais de R$ 9 milhões na recuperação do imóvel.
Junta Comercial do Estado da Bahia (Juceb) av Estados Unidos no bairro do Comércio
| Foto: José Simões/Ag A TARDE
As intervenções contemplaram desde a demolição de estruturas comprometidas até a implantação de sistemas novos de infraestrutura elétrica, lógica, hidrossanitária e climatização.“A autenticidade é a essência que confere valor a um edifício histórico, pois ela materializa a memória, a técnica e a identidade cultural de um período. Em Salvador, onde a arquitetura colonial e eclética dialoga diretamente com a história do Brasil, preservar essa integridade é um desafio que exige equilíbrio entre conservação e adaptação. A chave está em adotar uma abordagem crítica, na qual cada intervenção seja justificada, documentada e, sempre que possível, reversível”, explica Ingrid Silva Assis Santana.A engenheira aborda ainda trabalho realizado pelo grupo de pesquisa “Tecnologia da Preservação e Restauração” da Faculdade de Arquitetura da UFBA. “Entendemos que a autenticidade só será plenamente preservada quando houver uma gestão colaborativa, capaz de integrar políticas públicas, financiamento adequado, capacitação de mão de obra especializada e participação ativa da população no processo. É possível transformar esses desafios em oportunidades de preservação viva, onde cada agente contribui”, completa.