Como um jovem do interior da Bahia conquistou a Nasa com foto da Lua

Uma noite a cada 20 anos Júpiter e Saturno aparecem no céu da Terra bem próximos um do outro, fenômeno astronômico chamado de Grande Conjunção. Próximos é uma maneira de dizer. A depender de suas rotações, ambos podem atingir em média 600 milhões de quilômetros, mas nesse dia, a cada duas décadas, eles parecem vizinhos de porta, vistos desde a Terra. Um momento que é aguardado ansiosamente por astrônomos profissionais e amadores de todo o mundo.Em dezembro de 2020, em plena pandemia de Covid-19, telescópios de todos os continentes apontaram para o universo a flagar os dois planetas se exibindo juntinhos, de uma forma que não acontecia desde 1623, causando uma enorme alegria, mas também inveja aos terráqueos amantes do espaço que, em meio ao isolamento social, não podiam encontrar presencialmente os amigos para conversar sobre os fantásticos corpos celestes.Naquele momento, há quase cinco anos, lives e mais lives pipocaram no ciberespaço, em vários idiomas, através do YouTube, do Facebook e do Instagram para compartilhar o deslumbramento com as imagens do espaço sideral. Um desses centros de captação da beleza universal está em Conceição do Coité, a 229,3 quilômetros de Salvador, onde um telescópio Sky Watcher aponta para o espaço.O aparelho está na casa do comunicador e astrônomo amador Alexsandro Mota, que se encantou pelo universo pela primeira vez aos seis anos de idade, ao contemplar o céu da zona rural de seu município, isento de poluição e das luzes artificiais da cidade.

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Um pouco mais velho, ele se deu conta que havia um corpo celeste parecido a uma nuvem, mas que permanecia estático. Todos os dias, no mesmo lugar. Alexsandro descobriria mais tarde que era uma nebulosa, uma aglomeração de gases e de poeira estelar. “A astronomia se tornou algo diário em minha vida em 26 de outubro de 2013, quando eu criei o projeto de divulgação científica Mistérios do Espaço”, afirma Alexsandro, com a precisão de quem relata o posicionamento exato de um astro.Doze anos depois, a conta do Mistérios do Espaço no Instagram tem mais de 150 mil seguidores. No YouTube são 895 mil. O seu telescópio está conectado a um laptop e em suas lives, às vezes, surge uma chuva de meteoros ou um bólido, como se chama um meteoro que explode e emite uma luz especialmente brilhante.No último final de semana, uma parte dessa audiência assistiu a um vídeo de pouco mais de oito minutos no qual Alexsandro explica a dinâmica dos meteoros. O conteúdo, que obteve mais de 7 mil visualizações no YouTube, foi motivado pela passagem de um desses corpos pelo agreste pernambucano na noite de 31 de julho.
Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por A TARDE (@atardeoficial)Na segunda, dia 4, Alexsandro compareceu à Câmara Municipal de Conceição do Coité para receber uma moção de aplauso dos vereadores. O jovem coiteense encheu seus conterrâneos de orgulho, depois que uma imagem sua foi publicada pelo site da Nasa no dia 12 de julho, como a foto do dia. Dois dias antes, Alexsandro registrou, na hora do pôr do sol, a lua no céu do município, sob o reflexo da luz do Astro-Rei. Como procedeu em diversas vezes, enviou a foto para o site da Nasa, via e-mail. Desta vez, obteve sucesso.O êxito de Alexsandro não se limita à publicação da sua foto. O seu projeto de divulgação científica cresceu tanto que a sua formação universitária não deve servir para que ele procure um emprego ou invista em uma carreira acadêmica. O que os seus posts e vídeos faturam com publicidade tem sido suficiente para mantê-lo. “Eu uni duas coisas pelas quais eu sou completamente apaixonado, a astronomia e a comunicação. Eu adoro o audiovisual, adoro produzir conteúdo para a internet”, afirma Alexsandro, que declara ser muito gratificante ter o universo como matéria-prima de seus vídeos.Uma das maiores inspirações do jovem coiteense, que completa 26 anos no próximo dia 6 de setembro, é o astrofísico e escritor estadunidense Carl Sagan, morto em 1996, três anos antes do seu nascimento. “Na infância, eu assistia a documentários no Discovery e lia todos os livros de astronomia que eu encontrava na biblioteca. Mas o que me fez ficar apaixonado pela astronomia até hoje foi o acesso a um céu noturno muito bom”, conta Alexsandro.O jovem comunicador integra uma rede informal de astrônomos amadores de todo o país. Constantemente, eles trocam figurinhas e quando alguém não consegue registrar um fenômeno astronômico pode recorrer a um amigo.Além de sua cidade, como um todo, há um grupo bastante encantado com a trajetória de Alexsandro, os seus professores. “Ele vai fazer um percurso interessante, que nasce de um projeto do ensino médio, vai até a universidade e se torna um grande meio de divulgação científica”, elogia o professor Moisés dos Santos Viana, doutor em difusão do conhecimento pela Ufba e orientador de Alexsandro no Trabalho de Conclusão de Curso na graduação em Comunicação Social (Rádio e TV) da Uneb, em Conceição do Coité.O professor Moisés destaca o fato de que o jovem divulgador traduz para o público em geral discursos, questões e métodos científicos. “Sendo um canal do YouTube, esse veículo vai aproximar conceitos da ciência da população e isso é muito importante”, defende o professor.O sucesso de Alexsandro remete a um meme. Quando acontece algo inusitado no Brasil a partir da ação de um indivíduo, os internautas costumam dizer, brincando, que os brasileiros precisam ser estudados pela Nasa. Mas às vezes só é preciso que a Nasa reconheça um talento.

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