Porto das Sardinhas: exposição revela beleza invisível do Subúrbio

Com o propósito de comemorar e celebrar a primeira exposição individual do artista e educador baiano José Eduardo Ferreira Santos, 50, no mesmo momento em que o Acervo da Laje – espaço de memória artística, cultural e de pesquisa – completa 15 anos de atuação no Subúrbio Ferroviário de Salvador, a mostra Zé di Cabeça – Porto das Sardinhas segue em cartaz até 30 de agosto na Pivô Salvador (Boulevard Suíço, Nazaré).Inédita, a mostra inaugura o programa expositivo da Pivô – composto por ações, encontros, visitas guiadas, bate-papos – e também celebra o segundo ano de aterrissagem desta plataforma paulista, de experimentação artística e pensamento crítico, na capital do dendê.Na mostra, Zé di Cabeça, pseudônimo artístico de José Eduardo, apresenta um recorte de sua produção pictórica produzida nos últimos anos – através de centenas de pinturas sobre madeira, azulejo e papel – atravessada pelas camadas afetivas, simbólicas e políticas de seu território.Para Zé, um dos intuitos é festejar a relação estabelecida entre o Acervo da Laje e a Pivô. “Nada melhor do que celebrar com uma exposição que faz um recorte a partir dos inventários da vida, das memórias da cidade, principalmente do Subúrbio Ferroviário, a partir dos azulejos, e também dos pássaros imaginários e palavras imaginárias que compõem o Brasil”.Toda trabalhada com material de reciclagem encontrado nas ruas, na maré e no Porto das Sardinhas (São João do Cabrito), como madeira de construção e de barco, a mostra quer chamar atenção para uma consciência ambiental mais legítima e contínua.“Então, o nosso trabalho é muito disso, de olhar para as marés, para os chãos, ver a madeira que é dispensada, que é jogada fora, e transformar aquilo numa obra de arte. Eu acho que o propósito da exposição é um pouco trazer à tona que a memória e a beleza podem estar também presentes nesses suportes que a gente descarta”, relata Zé di Cabeça.

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Diálogo territorialCom curadoria do pesquisador catarinense Ramon Martins, 35, gerente de programas da Pivô Salvador, Zé di Cabeça – Porto das Sardinhas está subdividida em três composições: Inventariar, Imaginar e Presentificar.“Em Inventariar, criamos uma composição com as séries galos, ex-votos, velas e pitanga, que são desenhos sobre madeira, de diversos formatos e dimensões, recolhida nas andanças pelo Porto das Sardinhas. Em Imaginar, apresentamos duas séries de aves fantásticas, que propomos como espécies que povoam o Porto das Sardinhas”, detalha Ramon.“Em Presentificar, o público encontrará pinturas em azulejos que trazem o patrimônio edificado do Subúrbio Ferroviário, um trabalho colaborativo com o artista Prentice Carvalho, trazendo o que está sendo ameaçado por processos, seja de especulação imobiliária ou urbanização”, alinhava o curador.Ramon conta que, em sua curadoria, foi guiado pela ideia de que a produção de Zé não apenas documenta, mas dá condições de reinventar a narrativa do subúrbio.“Seu trabalho não se limita a representar o lugar, mas é alimentado por ele e funda o próprio lugar, a partir da vida pulsante no cotidiano do artista”, observa.Zé di Cabeça ainda é uma persona artística tímida com relação ao conhecido José Eduardo, mas com uma produção grande em um curto período de prática, de acordo com Ramon. “Esta mostra nos permite pensar a relação do artista com seu território, nutrindo-se da memória, da imaginação e do cotidiano, e propondo narrativas vivas que apresentam um subúrbio a partir de uma gramática que questiona estigmas e invisibilidade”.Consciência ambiental

|  Foto: Divulgação

Através do Acervo da Laje, José Eduardo lida com arte e educação, oferecendo atividades semanais para crianças, jovens e adultos, além de congregar artistas suburbanos. Sua produção artística está profundamente relacionada à construção do território a partir da arte, colocando algumas regiões relegadas na cartografia afetiva da cidade.Com seu trabalho, ele quer abordar a urgência de se criar uma consciência ecológica e ambiental, mas também provocar reflexões sobre o subúrbio dentro da cidade e sobre o lugar da periferia nas artes.Segundo o próprio José Eduardo, cada pessoa que comprar uma obra estará contribuindo efetivamente para a sustentabilidade do planeta, a melhoria das mudanças climáticas e para tornar o mundo um lugar mais habitável.“Cada um de nós tem uma poética e ela tem que ser expressa. A minha nasce de olhar o chão da minha cidade, de olhar para aquilo que o mar traz, de pegar o material que polui o mundo e transformar em uma obra que possa ser vista como algo bonito, íntegro, novo e que traga uma memória estética para nossa vida”, finaliza.Zé di Cabeça – Porto das Sardinhas / até 30 de agosto / Pivô Salvador – Rua Boulevard Suíço, 11ª, Nazaré / visitação: segunda a sábado, das 14h às 19h / Gratuito

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