Base forte, futuro sem preconceito: o caminho para mudar o futebol

Em todo jogo, uma coisa é praticamente certa – alguma torcida terminará os 90 minutos criticando o árbitro da partida. Se todo homem, juiz, já sofre tanta retaliação, imagine a vivência de uma mulher negra nessa posição. Esse é o dia a dia de Daniella Coutinho Pinto, árbitra assistente da Fifa.Vivendo as interseccionalidades que marcam sua personalidade, ela sabe melhor do que ninguém o quanto é necessário saber se impor e, mais que isso, resistir aos preconceitos sofridos. Por isso, para ela, quando se fala de racismo e machismo, não basta conscientizar a sociedade: é essencial também preparar mulheres e pessoas negras desde sempre para ocupar espaços no futebol, historicamente marcados por discriminação.“Assim como é necessário conscientizar a sociedade, é importante conscientizar o negro de que ele pode ocupar aquele espaço. Muitos desistem por não estarem preparados para enfrentarem aquelas agressões. Esse fortalecimento precisa ser feito desde criança, nas bases dos clubes, para que eles entendam a força que eles têm e que não é a cor deles que vai classificar se eles vão se tornar um grande jogador ou não”, opinou durante o seminário ‘Racismo no Futebol: Combate à Discriminação nos Estádios’.Essa responsabilidade se estende às figuras que já lutaram e tiveram sucesso em suas caminhadas, servindo de referência para o futuro. “Enquanto negros, nós temos o papel de espelhar outras pessoas. Hoje eu cheguei em uma posição que não foi a cor da minha pele que me garantiu estar ou não, mas sim meus esforços”, diz. “Eu tive que lutar, assim como um branco. Eu passei por testes físicos, técnicos. A gente tem que entender que não é porque é negro e tá sendo discriminado, sofrendo retaliações, que não vai chegar ali. Muitas vezes é justamente por não conseguir passar por esse processo”, analisa.

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Vivendo em uma família miscigenada, com lado paterno negro e materno branco, Daniella conta que isso lhe dá uma visão ampla sobre o tema: “Eu vivo esses dois vieses e consigo mensurar. Muitas vezes a gente coloca o branco como nosso inimigo, mas não é. Muitas vezes o racismo tá no negro, porque ele não acredita que pode estar lá por ser negro. Falta empoderamento para as crianças”.

Daniella Coutinho durante o seminário ‘Racismo no Futebol: Combate à Discriminação nos Estádios’

|  Foto: José Simões/Ag. A TARDE

Transformação na basePor isso, muito além dos eventos aos quais vai como árbitra, Daniella nunca deixa de visitar escolas, falando com o futuro do futebol e da arbitragem brasileira. “Quando eu palestro em escolas, as crianças mais retintas estão mais encabuladas. A gente precisa valorizar essas crianças. É muito agressivo quando eu tô trabalhando e escuto da torcida uma ofensa gratuita. Hoje eu já sou adulta, mas e uma criança que joga na base?”, reflete.Para Daniella, então, a transformação deve começar exatamente nesse ponto: a base. “Eu sou muito apegada às crianças. A base é muito importante. Também pode ser inserido algo desse tipo dentro dos clubes, fortalecendo a base e intervindo futuramente para mudar nossa realidade”, finaliza.

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