Leia Também:
Entenda a diferença entre DMT, Ayahuasca e Jurema
Ayahuasca, rapé e jurema: medicinas indígenas viram alvo de patentes
Na experiência espiritual proporcionada pelo Nixi Pãe, há encontros com o próprio eu, com os animais, com a floresta e com o espírito da terra, segundo Shakuany.“Espiritualmente, ela abre os portais do mundo invisível. Faz a pessoa lembrar de quem é, de onde veio e para onde está indo. O Nixi Pãe traz o entendimento de que tudo está vivo, o rio, as árvores, os animais, os ventos, a terra. Ele limpa o espírito, cura traumas, desperta dons e fortalece a conexão com a missão de vida. Ensina a humildade e o respeito com tudo que existe”, diz.
Sao Paulo, SP, Brazil – December 16 2023: Ceremony altar, bottle with Ayahuasca, bone tepi for applying snuff.
| Foto: Adobe Stock
Interesses externos: ameaça ou fortalecimento?Nos últimos anos, o uso da ayahuasca tem crescido em ambientes urbanos, muitas vezes longe dos contextos tradicionais e espirituais. Shakuany explica que é necessário muito cuidado e preocupação com a medicina.“Muitos não entendem que o Nixi Pãe não é uma bebida qualquer, mas sim um espírito que exige preparo, respeito e orientação. Quando se consome de forma desenfreada, sem guia, sem tradição, corre-se o risco de abrir portais perigosos e de perder o verdadeiro sentido da medicina. A banalização pode causar desequilíbrios espirituais e desrespeito à ancestralidade”, alerta.O interesse crescente de não indígenas pela ayahuasca pode representar tanto um risco quanto uma oportunidade. A partir do momento que houver lucro e ego, se torna um roubo da cultura.“Depende de como esse interesse é cultivado. Se for com respeito, escuta, aprendizado com os povos de origem, pode fortalecer, gerar pontes de cura e preservação. Mas se for movido pelo lucro, curiosidade ou ego, ameaça sim, pois desvaloriza a cultura, rouba o saber sem permissão e coloca em risco a integridade da medicina e do povo que são guardiões”, ressalta Shakuany.
Shakuany Huni Kuin cantando em ritual
| Foto: Arquivo Pessoal
As diferenças entre o uso indígena e os contextos urbanos são grandes, segundo a jovem. Para os Huni Kuins, a ayahuasca é a representação da ancestralidade do povo.“Para nós, o Nixi Pãe está dentro de um contexto ancestral, com cantos sagrados, dieta, pinturas, rezas, jejum e orientações do pajé (neybeya) ou dos mais velhos. Na cidade, muitas vezes falta isso. A música muda, o tempo de preparo também, e o sentido se transforma. Isso não quer dizer que é errado, mas sim que é outro caminho, que precisa de muita responsabilidade e humildade para não se perder da origem”, pontua.Preparo para a medicinaParticipar de um ritual de Ayahuasca exige mais do que vontade. Segundo a sabedoria Huni Kuin, há uma preparação espiritual essencial.“É necessário entrar com o coração limpo, com boa intenção e com respeito. Jejuar, evitar comidas pesadas, contato sexual, álcool e pensamentos negativos. A mente precisa estar tranquila, o corpo preparado e o espírito disposto a aprender”, pontua Shakuany.Além disso, ela reforça que é indispensável estar sob orientação de quem conhece o caminho – os pajés, mestres ou anciãos que guardam a sabedoria de lidar com os espíritos despertados pelo Nixi Pãe.
Feitio da medicina Ayahuasca
| Foto: Adobe Stock