Dá para segurar a inflação sem subir a taxa de juros?

A inflação voltou ao centro do debate econômico no Brasil. Tradicionalmente, o Banco Central utiliza a taxa Selic como principal instrumento para conter a alta dos preços. A lógica é simples: ao encarecer o crédito e reduzir o consumo, a pressão inflacionária tende a diminuir. Mas especialistas alertam que esse caminho tem custos altos, sobretudo para a população mais pobre.

A grande questão é: seria possível controlar a inflação sem recorrer ao aumento dos juros?

Por que o modelo atual é criticado

O chamado “tripé macroeconômico” — meta de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal — deu previsibilidade à economia brasileira desde os anos 1990. No entanto, críticos afirmam que as regras atuais não conversam com a realidade do país.

Diferente de economias industrializadas, o Brasil ainda depende fortemente de commodities como minério de ferro, soja e algodão. Isso significa que choques de oferta, como quebras de safra ou crises internacionais, impactam os preços de forma mais intensa e rápida.

Ao mesmo tempo, aumentar os juros não resolve problemas de oferta, apenas reduz a demanda, atingindo diretamente quem tem menos poder aquisitivo.

O impacto da taxa de juros na economia real

Subir os juros tem dois efeitos imediatos:

  • Reduz o consumo, já que o crédito fica mais caro e famílias compram menos;

  • Desestimula investimentos, pois empresas evitam ampliar a produção em um cenário de custo de capital elevado.

Na prática, isso significa que setores estratégicos deixam de expandir e a geração de empregos é freada. Para as classes mais pobres, o efeito é ainda mais cruel: enquanto a inflação corrói o poder de compra, o aumento dos juros pode tirar do mercado milhões de consumidores, agravando a desigualdade.

Alternativas possíveis para controlar a inflação

Especialistas defendem ajustes criativos no modelo econômico, em vez de simplesmente apertar a taxa de juros:

1. Flexibilização da meta de inflação

A meta brasileira caiu de 4% para 3%, sem que houvesse mudanças estruturais que justificassem a redução. Manter a meta em 4% ou adotar bandas mais largas poderia evitar elevações desnecessárias da Selic.

2. Metas plurianuais

Estender o prazo para cumprimento da meta, de anual para bianual, daria mais tempo para a economia absorver choques temporários, como secas, enchentes ou crises externas.

3. Políticas de oferta

Investimentos em infraestrutura, crédito direcionado a setores produtivos e incentivos à industrialização poderiam aumentar a capacidade de oferta e reduzir pressões inflacionárias no médio prazo.

4. Foco no combate à desigualdade

Em vez de penalizar a base da pirâmide social, políticas públicas podem proteger o consumo das famílias mais vulneráveis, equilibrando o impacto da inflação sem recorrer a cortes bruscos na atividade econômica.

O papel do contexto internacional

O cenário global também influencia diretamente a economia brasileira. Durante anos, países desenvolvidos viveram com juros reais próximos de zero. Hoje, após a pandemia e o choque inflacionário global, os Estados Unidos e a Europa voltaram a operar com taxas elevadas.

Essa mudança de contexto pressiona o Brasil a manter juros altos para evitar fuga de capitais. Mas especialistas questionam se seguir cegamente os passos das economias centrais é o melhor caminho, já que a estrutura produtiva e social brasileira é muito diferente.

O custo social da inflação e dos juros altos

A inflação corrói salários, mas os juros altos podem ser ainda mais perversos. Ao reduzir a atividade econômica, eles geram desemprego e retraem investimentos. Para quem vive com a renda comprometida, a escolha entre uma inflação de 5% e o desemprego é clara: sem trabalho, o impacto é muito mais devastador.

Além disso, o aumento dos juros concentra renda, já que os mais ricos conseguem investir em ativos de baixo risco com remuneração elevada, enquanto os mais pobres perdem poder de compra.

Uma economia a serviço das pessoas

O debate sobre inflação e juros vai além da técnica econômica: trata-se de decidir qual modelo de país queremos. A economia, como lembram especialistas, não deve ser um fim em si mesma, mas um meio para garantir qualidade de vida.

Criatividade, flexibilidade e políticas mais ajustadas à realidade brasileira podem oferecer alternativas viáveis ao modelo atual. Afinal, segurar a inflação é importante, mas não às custas de aprofundar a desigualdade social.

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