Advogado faz forte desabafo após morte de Daniel Keller; confira

A morte do professor e advogado criminalista Daniel Keller, que aconteceu na manhã de sexta-feira, 13, no bairro do Caminho das Árvores, em Salvador, levantou diversos questionamentos sobre as circunstâncias do fato já que foi encontrada uma arma dentro do quarto onde ele foi achado sem vida.[ALERTA DE GATILHO: Esta matéria contém informações sobre suicídio. Se você está enfrentando problemas de ordem mental, procure ajuda pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), através do telefone 188]Em nota, a Polícia Civil informou que o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) foi acionado sobre a morte de Daniel Joau Perez Keller, de 41 anos, cujo corpo foi localizado dentro de um apartamento no Caminho das Árvores. Uma arma de fogo foi recolhida pelo Serviço de Investigação de Local de Crime (SILC) e será periciada.Ainda segundo a polícia, as guias para o trabalho do Departamento de Polícia Técnica (DPT) foram expedidas e os laudos vão auxiliar na apuração. Equipes da 1ª Delegacia de Homicídios (DH/Atlântico), que vai investigar o caso, estão no local coletando informações e imagens de câmeras de segurança. Oitivas de testemunhas e familiares serão realizadas no DHPP.Em conversa com a imprensa, a delegada titular da 16ª DT, Maritta Souza, disse que as investigações estão avançadas e a perícia foi muito bem feita no local do crime. “A gente está investigando ainda. Foi concluído o levantamento cadavérico e estamos concluindo também as investigações. Hoje serão ouvidas algumas pessoas que importam para o esclarecimento de todo o fato. Elas estão se dirigindo para a DHPP pra poder fazer essas oitivas”, contou. “A gente já está concluindo mais ou menos o que se trata”, acrescentou.Mas, o mundo jurídico também lamentou bastante o falecimento do advogado e um dos atores do Direito que ficou bastante tocado foi o advogado Vinicius Santana Melo que publicou uma carta aberta nas suas rede sociais.Ele inicia dizendo que escreve em um momento que já não adianta mais no sentido de poder ajudar a colega, mas diz que pode servir para ele mesmo e relata não ser próximo a Keller, porém pontua a perda o tocou mesmo não sendo íntimo.”Eu escrevo agora, quando já não adianta. Escrevo para o depois, para o nunca, para o silêncio. Escrevo quando não há mais destinatário, não há mais olhos que leem, nem mãos que possam tocar. Escrevo, talvez, para mim mesmo – ou para o mundo que Insiste em chegar tarde. A sua morte não me toca como a de alguém íntimo. Não nos falávamos com frequência. Não partilhamos grandes conversas. Não fui seu aluno, nem seu colega próximo. Mas há perdas que nos ferem mesmo assim – talvez porque, no fundo, sabemos que não deveriam ter acontecido assim, do jeito que aconteceram”, iniciou.Ele refletiu ainda que o mundo não se preocupa em querer saber se o outro está bem e as pessoas aparentam ser solidárias, mas de fato não se importam. “Vivemos tempos em que todo mundo quer parecer solidário, mas poucos se importam de fato. É fácil escrever homenagens depois. É fácil usar palavras bonitas quando o outro já não está aqui para exigir humanidade. Mas em vida, onde estavam essas palavras? Onde estavam os gestos? Onde estávamos todos nós?” Quantas vezes alguém perguntou, de verdade, se você estava bem? Quantas pessoas olharam nos seus olhos e viram para além da função, da tese, da assinatura institucional? Quantas estavam dispostas a ser abrigo, e não apenas plateia? É duro dizer isso, mas a sua morte carrega em si a sombra de um erro coletivo”, pontuou.”Erramos com você, Daniel. Erramos porque deixamos você partir em silêncio. Erramos porque só agora nos mobilizamos para sentir. Erramos porque amamos tarde demais – e esse é o amor que já não serve”, chamou a atenção.O advogado pede perdão por não ter sido tão presente quanto deveria. “Falo de um perdão que nasce da dor e da vergonha. Da consciência de que falhamos com um de nós – e falhamos de forma irreversível. A sua partida me atravessa como denúncia. Não apenas como lamento. Porque o que mais me dói, Daniel, é perceber que a gente só consegue sentir a gravidade da ausência quando se depara com o próprio abandono. E você, antes de ser professor, advogado, tribuno de excelência, era um ser humano”. Um homem real, E como qualquer um de nós: falível, complexo, exausto em certos dias”, relatou.”E ainda assim – talvez justamente por isso você merecia mais. Mais cuidado. Mais presença. Mais escuta sem pressa. Mais mãos que segurassem as suas quando elas tremessem. Mas o que oferecemos, quase sempre, é o contrário disso. A ausência confortável, o silêncio protocolar, a indiferença que se esconde sob a desculpa da ‘correria'”, acrescentou. “E é só quando a morte escancara o que a vida tentou mostrar de forma sutil, que percebemos o quão tarde já é.”Ele faz uma crítica ao meio jurídico onde muitos demonstram a sua sofisticação na produção, mas esquecem do afeto. “O mundo acadêmico e o mundo advocatício, especialmente, são cruéis. Sofisticados, polidos, cheios de ritos e reverências, mas cruéis. Os títulos se sobrepõem aos afetos. A produção vale mais que o estado emocional. O corpo só importa quando rende. E quando não rende mais, vira ruído, desconforto, ausência conveniente”, escreveu.”E se há algo a se aprender com a sua partida, é que a presença necessita ser mais do que uma assinatura em lista. Precisa ser escolha. Um gesto deliberado de afeto”, refletiu. “Que a sua partida nos destrua a ponto de nos refazer. Porque ninguém deveria ser amado apenas quando vai embora. E nenhum ser humano deveria ser esquecido por detrás de seus títulos. Com pesar que não passa. Com esperança de que a sua dor tenha cessado”, concluiu.
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