Professores decidem continuar em greve, criticam falta de negociação e negam versão da PBH sobre salário de R$ 13 mil

Infraestrutura defasada, desvalorização e reajuste salarial abaixo do Piso Nacional. É esse o cenário narrado pelos professores da rede municipal de Belo Horizonte, que decidiram na tarde desta terça-feira (17) seguir com a greve, que já dura quase duas semanas, diante da ‘falta de negociação’ com a Prefeitura. Ao BHAZ, os profissionais explicam as demandas da categoria e negam a versão da Secretaria de Educação que alega pagar, em média, R$ 13 mil a um trabalhador que atua em tempo integral. Questionada sobre quantos servidores ganham esse valor atualmente e sobre as críticas da categoria, a Prefeitura não se posicionou até o fechamento da reportagem.

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A greve foi aprovada em assembleia no último dia 5 de junho. Os profissionais rejeitam a proposta de reajuste salarial apresentada pelo Executivo Municipal, que ofereceu um aumento de 2,49% aos educadores. O índice, segundo o sindicato, está abaixo do reajuste do Piso Nacional do Magistério para 2025, fixado em 6,27%.

Para a presidente do Sind-Rede/BH, Vanessa Portugal, a proposta é “absolutamente insuficiente”. Segundo o sindicato, as perdas salariais da categoria chegam a 47%, considerando o reajuste do piso nacional do magistério e os índices aplicados pela Prefeitura entre 2017 e 2025.

“O índice de perdas que nós apresentamos para Belo Horizonte é de 47%. Temos compreensão de que seria difícil para o município atender esse reajuste numa campanha salarial, mas a prefeitura precisa indicar qual o movimento que ela vai fazer para que a gente não continue acumulando perdas. 2,49% não é uma resposta digna”, pontua.

Segundo o sindicato, o reajuste proposto desvaloriza os profissionais da educação, mesmo diante do aumento na arrecadação municipal e do repasse ampliado de recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). Além disso, a entidade afirma que os recursos destinados à educação vêm sendo utilizados de forma desconectada das reais necessidades das escolas.

“A educação é tratada como prioridade somente no discurso eleitoral. Depois o que os eleitos fazem com o dinheiro da educação é qualquer coisa. Nós temos um descaso absoluto com a educação na cidade”, diz Portugal.

Outro ponto questionado pelos trabalhadores é a inclusão do vale refeição na proposta de recomposição salarial: “A prefeitura apresenta o vale refeição como se fosse uma recomposição salarial. E nós não estamos substituindo uma coisa pela outra. Salário é salário: incide na carreira, na aposentadoria e a prefeitura de Belo Horizonte tem condições de atender às nossas reivindicações. Vale refeição não é recomposição salarial”.

‘Professores não recebem R$ 13 mil’

Vanessa diz ainda que a PBH “mente” ao considerar a dobra de turnos como salário referente aos cargos de magistério. Em nota, o Município disse que “o salário médio de um professor de ensino fundamental que trabalha, por exemplo, nos turnos da manhã e tarde é de mais de R$ 13 mil”.

“Isso é mentira. Existem professores que recebem R$ 13 mil, mas isso é porque eles têm dois cargos, trabalham por 10 horas e têm mais de 20 anos de profissão. Além do curso superior, têm vários cursos de pós-graduação, mas essa não é a média, nem a realidade da rede”.

Ainda conforme o sindicato, o salário inicial de um professor com curso superior é de R$ 3.488,30. “Isso [salário de R$ 13 mil] não está no contracheque da ampla maioria é dos trabalhadores em educação. Então, na verdade ela dá uma informação é com base num cálculo que tem uma tentativa de enganar a população de Belo Horizonte”, completa.

Problemas na sala de aula

Quem oferece um panorama da realidade dos professores na sala de aula é Rosalina Gomes. Dos seus 57 anos, passou 30 se dedicando à educação e hoje trabalha na Escola Municipal Presidente Trancredo Neves, no bairro Céu Azul, região de Venda Nova, em Belo Horizonte.

“Eu sou professora do atendimento educacional especializado. Trabalho com crianças e adolescentes com deficiência”, inicia. De acordo com a professora, cada turma de atendimento especializado tem cerca de 24 alunos, que precisam de materiais específicos para estudar.

“A dificuldade que a gente tem é com a materialidade, que a gente precisa em sala de aula. Por exemplo, a escola precisou reduzir a quantidade de xerox por professor, porque não tem dinheiro. Os adaptadores de lápis que os alunos precisam, a escola não pode comprar”, conta.

“Também é uma demora para conseguir arrumar uma impressora. E quando tem impressora, não tem o dinheiro para comprar a tinta. Aí a qualidade do atendimento fica péssima”, diz.

“A gente sente desvalorizada, e gente fica na insegurança porque os alunos estão sem aula. A gente sabe que quando voltar, a gente vai ter que que começar tudo de novo, mas a única a única estratégia que a gente tem é da greve”, completa.

Os docentes também chamam atenção para a defasagem no quadro de professores do município. “Nós temos uma situação que tem a ver com o número de crianças em sala de aula, é é um número elevado para o grau de complexidade que nós temos dentro das escolas hoje. Faltam professores dentro das escolas, então precisa ampliar o quadro de professores”, comenta Vanessa.

A situação já foi apresentada em reuniões com a Secretaria de Educação, mas até o momento, segundo a categoria, não houve proposta de solução por parte do município.

Rosalina compartilha da opinião e enfatiza que um dos maiores entraves enfrentados pela categoria é a dificuldade para manter uma conversa com a Prefeitura: “Queremos um diálogo mais aberto com as secretarias, com quem está nas administrações, porque a gente tem um diálogo, mas a gente não é atendudo. Então não é um diálogo, é um monólogo”.

No âmbito financeiro, o impasse se mantém. Segundo, ao Sind-Rede/BH, os professores conseguiram se reunir cerca de 12 vezes com a Secretaria Municipal de Educação, a Subsecretaria de Gestão de Pessoas e a Secretaria de Planejamento, mas em nenhum dos encontros conseguiram chegar a um consenso.

“O Executivo apresentou propostas prontas, sem abertura para contrapontos ou construção coletiva. O anúncio do índice de reajuste foi feito de forma unilateral, sem transparência sobre os critérios adotados para a composição do índice nem diálogo com a categoria”, diz o coletivo em nota.

Famílias são afetadas pela greve

Famílias de estudantes sentem na rotina os impactos da paralisação. Os dias longe da escola fazem diferença na vida da Sophia, de 8 anos, aluna da escola integrada Monsenhor João Rodrigues de Oliveira, no bairro São Geraldo, na região Leste de BH. Ao BHAZ, o pai da menina, Humberto Rocha, de 45 anos, relata que a filha sente falta da convivência com os amigos e do aprendizado. “Ela é uma menina que adora ir na escola, me pergunta todos os dias: “Pai, não vai voltar não?’ Ela tem amizades na escola, adora as coleguinhas, adora aquele convívio escolar”, comenta.

Só que as dificuldades não param por aí. Humberto, que é pai de dois filhos dentro do espectro autista, diz que ficou mais difícil trabalhar depois que as aulas da menina foram interrompidas. “Eu sou motoboy, trabalho com aplicativo. Por eu faturar por conta própria, eu não tenho um salário fixo, e quanto mais eu trabalhar na moto, mais eu ganho”, explica.

Sem ter onde deixar a filha, Humberto precisa ficar em casa para tomar conta da pequena, o que acaba afetando a renda da família. “A Sofia fica na escola integrada. Eu deixo ela às 7 horas da manhã e pego ela às 17h20. Então, dá um espaço muito grande para eu trabalhar. Com essa greve agora atrapalha muito”.

“Eu tenho a minha mãe, que é uma senhora de idade, e me ajuda de vez em quando. Mas mesmo minha mãe me ajudando, tem dia que ela tem que resolver as coisas dela. Eu não posso ficar por conta da minha mãe, porque ela tem a vida particular dela”, completa.

O que diz a PBH?

O BHAZ entrou em contato com a Prefeitura de Belo Horizonte para obter um posicionamento sobre as críticas de hoje dos professores, mas não houve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto e a reportagem será atualizada tão logo haja o envio das respostas.

Desde o início do movimento grevista, a PBH tem se posicionado com a seguinte nota (veja na íntegra):

“A Prefeitura de Belo Horizonte reconhece a importância dos profissionais da Educação e a necessidade constante de valorização e destaca que 100% dos profissionais do magistério da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte recebem salários acima do piso nacional. O salário médio de um professor de ensino fundamental que trabalha, por exemplo, nos turnos da manhã e tarde é de mais de R$ 13 mil.

Somente no comparativo entre março de 2022 e março de 2025, o aumento médio na remuneração dos professores da Educação Infantil foi de 91,4%, e o dos professores do Ensino Fundamental, de 69,7% – médias significativamente superiores à inflação do período, medida pelo INPC, que foi de 15,47%.

Contudo, todas as concessões devem ocorrer de maneira responsável, equilibrando as necessidades de diferentes setores para garantir a sustentabilidade financeira do Município. Com essa premissa, a Prefeitura informa que o índice de reajuste 2,49% representa o limite orçamentário para despesas dessa natureza e qualquer outra proposta extrapola as finanças municipais.

O índice de 2,49% recompõe 100% da inflação acumulada entre janeiro e abril de 2025. O índice de correção, conforme o INPC, será aplicado de forma retroativa a maio e contemplará tanto os servidores ativos, quanto os aposentados e pensionistas. A recomposição incidirá sobre os salários, vencimentos, gratificações, abonos e benefícios.

O impacto anual do reajuste de 2,49% com o aumento do vale-refeição para R$60 e outras demandas especificas será de R$ 493 milhões, sendo R$ 156 milhões somente para a Educação, caso aceitem a proposta.

É importante destacar que a atual proposta não considera a inflação de 2024 porque a PBH concedeu naquele ano um reajuste de 8,04%, valor superior à inflação registrada no mesmo período, que foi de 4,77%. Assim, toda a inflação de 2024 já foi concedida e ainda houve ganho real.

O Município sempre esteve aberto ao diálogo e realizou, de janeiro de 2025 até agora, 32 reuniões somente com o sindicato que representa a Educação para avanços nas pautas específicas e resolução de outras demandas da categoria“.

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