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A musicalidade é a principal diferença entre o samba junino e o tradicional. “O samba junino é um samba diferenciado, mais acelerado. Tem uma levada rítmica mais forte e pesada. O som é feito, principalmente, pelo timbal, tamborim e surdo, são esses os principais instrumentos. É por isso também que o samba é conhecido como ‘samba duro’. Outro ponto são as letras das músicas. As composições têm temáticas juninas. São sempre alusões e referências ao período junino” explica Vagner.O samba junino é o primeiro bem imaterial registrado pela Prefeitura de Salvador e, de acordo com Rocha, o registro da tradição como Patrimônio Cultural Imaterial da cidade significa um reconhecimento da sua importância histórica, cultural e identitária. “A partir do momento que o poder público institui que um bem é patrimônio cultural, isso garante o compromisso de um olhar especial para aquela manifestação. Então, a partir daí é possível estabelecer políticas públicas mais efetivas para a garantia da continuidade da tradição”, ele complementa.Dentre as ações de fortalecimento do costume, foi elaborado, em 2019, o Plano de Salvaguarda do Samba Junino, com o objetivo de assegurar a continuidade e a transmissão da tradição, bem como valorizar o trabalho dos músicos e seus grupos.Neste ano, foram destinados R$ 400 mil, através do edital Samba Junino – Ano VII, para a realização dos eventos e homenagens de figuras importantes.Programação do Samba Junino
| Foto: Olga Leiria | Ag. A TARDE
A programação tem como destaques o 47º Festival de Samba Duro Junino do Engenho Velho de Brotas, que acontece na terça-feira (24), às 18h, e o Festival Salvador, Samba Junino, marcado para 29 de junho, 15h, no Largo do Garcia.Entre amanhã, 21, e segunda-feira, 23, o bairro do Tororó recebe os ensaios dos grupos Mãe Bebê de Iansã do Samba Tororó, Samba do Índio: Festa de Caboclos e o tradicional Arrastão do Lobo Mau.Tradição de geraçõesA grande novidade desta edição são as homenagens aos mestres, realizadas na Praça Municipal no último domingo, 15. A cerimônia, que aconteceu no “Arraiá da Prefs”, celebrou a memória e o legado de figuras históricas que lideraram os grupos de samba junino. Foram homenageados com placas de reconhecimento os mestres Manoel dos Santos, Neivaldo de Oliveira, Jorge Oliveira, Rogério Santos, Edilvado Silva, Irailton do Bonfim, Joselita Sacramento e Luís Carlos. Os grupos contemplados pelo edital também se apresentaram.Criado no Vale do Matatu, antiga Baixa do Tubo, o grupo de samba Os Dez Mais do Samba é um dos pioneiros desta tradição. Fundado pelos mestre Toy, Mica e Valnei, o coletivo surgiu da criatividade dos mestres em fazer música com poucos recursos – os instrumentos eram improvisados: latas de manteiga e panelas velhas eram as responsáveis por fazer a instrumentalização das canções. Hoje, sob comando do ativista e gestor cultural Luis Carlos Lima, ou Mestre Kiabo, o grupo se mantém de pé, ativo e acumulando diversas premiações.
| Foto: Divulgação
Para a comunidade do Vale do Matatu, o samba junino é, de acordo com Kiabo, mais que um movimento artístico e cultural. A realização dos festejos movimentam a economia local e se configura como uma expressão profunda de pertencimento. “Os ensaios movem a comunidade como um todo, pois todos se envolvem. As pessoas colocam suas barraquinhas de quitutes, é o período em que a gente vê também grandes revelações de artistas na comunidade”, afirma o mestre.A tradição, que atravessa gerações, também marca a história familiar de Luís. Seu pai, Antônio Carlos — o “Bigurrilho” — já foi presidente do grupo e é apontado como o grande responsável por despertar sua veia artística.O legado, no entanto, não se encerra nele: sua filha Luisa Magalhães, de 18 anos, já é entusiasta da manifestação e sonha, um dia, se tornar mestre. “O samba junino pra mim é vida, é tudo. Nasci e fui criada nesse meio, hoje faço parte do grupo: canto e toco e espero levar isso para minha vida inteira. Meu pai e meu avô me ensinaram muita coisa e, com certeza, pretendo passar todos esses ensinamentos para meus filhos. Tenho vontade de apresentar o samba ao mundo para que todos saibam da sua importância”, afirma Luísa.Rafaela Mustafá, produtora cultural e pesquisadora dos sambas da Bahia, conta que a tradição influenciou até mesmo o surgimento de novos ritmos: o boom do axé music na década de 1990 é um grande exemplo.Graças ao movimento, os percussionistas e cantores de samba junino passaram a integrar as bandas de axé.Desafios do Samba JuninoPara que a tradição se mantenha e os sambas continuem sendo realizados, é preciso um esforço coletivo. Mustafá conta que o enfraquecimento dos grupos acontece principalmente pela falta de incentivo financeiro, já que as ações de apoio limitam-se principalmente ao período junino.“A falta de ganho financeiro faz com que as pessoas percam o estímulo. Além disso, percebo como é difícil passar qualquer tipo de manifestação popular às novas gerações, pois elas não estão visibilizadas na mídia. Os mais novos não têm interesse em tocar ou aprender aquilo que não é visto. Se isso é apagado nas comunidades, a gente não consegue acender isso nas novas gerações. Essa é uma das grandes dificuldades”, conclui a produtora.