O uso da inteligência artificial tem se tornado motivo de preocupação cada vez maior no campo político. Ferramentas de IA vêm sendo utilizadas nas redes sociais para promover e manipular conteúdo político, sem deixar explícito que se trata de simulações. Personagens virtuais são criados para atacar deputados e governos, buscando enfraquecer não somente agentes públicos, mas também as instituições do Legislativo e Executivo.Eduardo Café, advogado especialista em direito público e eleitoral, afirmou em um artigo publicado para a revista científica internacional Derecho y Cambio Social, que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não está preparado para processar tais ilícitos envolvendo IA. Mas, em entrevista ao A TARDE, explicou a posição do TSE na última eleição.”Ainda não há lei formal que discipline o uso, no geral, de IA, em que pese haver projetos de lei em tramitação no Congresso”, disse Eduardo Café. “Mas o TSE, desde as eleições de 2024, disciplinou por meio de resolução, proibindo totalmente o uso de deepfakes e estipulou regras para o uso de inteligência artificial”.Projeto no SenadoCom essa evidente ameaça à democracia do país, o Senado resolveu reagir como debate em torno da nova regulamentação eleitoral sobre uso de inteligência artificial nas campanhas, que está para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Uma das emendas recebidas pelo projeto foi do senador Jaques Wagner (PT-BA), que sugere a proibição de simular voz ou imagem de pessoas vivas ou mortas, mesmo com autorização, e independentemente de haver ou não intenção de enganar o eleitor em campanha.O publicitário e jornalista Xiko Melo, com mais de 30 anos na comunicação, diz que, a cada eleição, uma nova tecnologia surge prometendo revolucionar o jogo político.Ele lembra que, nos primórdios do marketing político moderno, era comum transformar o candidato em uma espécie de produto. Criava-se uma versão idealizada da figura pública: mais simpática, mais eloquente, mais humana. O objetivo era claro: vender uma imagem, conquistar a preferência do eleitor. “A diferença é que, agora, ao invés de apenas maquiar o discurso, pode-se literalmente colocar palavras na boca de alguém ou pior, fabricar completamente uma situação que nunca existiu”, diz.Para o cientista político João Vilas Boas, o uso irresponsável dessas ferramentas digitais afeta diretamente a democracia do país. “A utilização estratégica da inteligência artificial tem impactado profundamente a política e as instituições democráticas, especialmente em contextos polarizados como o brasileiro”, diz.Para ele, ao acelerar e sofisticar a desinformação, a IA distorce o debate público e compromete a qualidade das escolhas eleitorais. “Com conteúdos falsos cada vez mais verossímeis e direcionados a públicos específicos, o eleitor torna-se alvo de manipulação emocional”, explica o cientista.Vítimas dos ataquesNas plataformas do âmbito digital, algumas figuras políticas são vítimas contínuas de ataques, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente da Câmara Federal, Hugo Motta (Republicanos-PB), e o governador Jerônimo Rodrigues.Questionado sobre quais as punições existentes no âmbito da Justiça Eleitoral, o advogado Eduardo Café responde: “As punições para o uso proibido podem ir de multa, obrigação de retirada da propaganda e, a depender da gravidade, pode ser considerado abuso dos meios de comunicação ou fraude, gerando cassação e inelegibilidade. Existem programas que não estão nem ao nosso acesso e que custam muito caro, que fazem coisas muito perfeitas, que somente softwares específicos podem detectar”.Nessa mesma linha de pensamento, João Vilas Boas também confirma que esse contexto da perfeição de conteúdo político enganoso também existiu em outras eleições, como em 2018, quando se revelou o risco com os disparos em massa via WhatsApp. Desde então, as estratégias digitais evoluíram de forma acelerada, tornando-se mais refinadas e difíceis de rastrear a cada novo pleito. Nesse cenário, diz ele, a inteligência artificial se consolida como uma ameaça concreta à integridade do processo democrático.
Uso de inteligência artificial em campanhas preocupa especialistas
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