Ex-funcionário da Voepass diz que falha em avião foi omitida antes de voo que matou 62 pessoas em SP


O ex-funcionário da Voepass que conversou com exclusividade com o g1 não quis se identificar.
Reprodução
Quase um ano depois do acidente da Voepass, que matou 62 pessoas no interior de São Paulo, um ex-funcionário da empresa revela que uma falha no avião teria sido omitida antes do voo. Ele conversou com exclusividade com o portal g1.
A testemunha trabalhava na manutenção da Voepass e estava no hangar na madrugada do dia do acidente. Ele contou que o último piloto que comandou a aeronave naquela noite relatou que o avião tinha apresentado problemas no sistema de degelo. O ex-funcionário concedeu entrevista ao g1 e não quis se identificar.
“Essa aeronave nunca tinha apresentado esse tipo de falha, né? Só que no dia do acidente, quando essa aeronave chegou de Guarulhos para Ribeirão, ela foi reportada verbalmente pelo comandante que trouxe ela, reportou para o mecânico que foi buscar a aeronave no pátio. Ele acionava e ela desarmava. Coisa que não poderia acontecer”, conta a testemunha.
Mas segundo o relato, o piloto passou a informação apenas verbalmente e não registrou a falha no diário de bordo técnico. Por isso, a manutenção foi ignorada pela liderança do hangar naquela madrugada.
“O próprio líder questionou, falou, bom, se ele não reportou em livro não tem pane na aeronave, que esse era o legado da empresa. Se o comandante reporta, tem ação de manutenção. Se não reportou, eles não vão perder tempo com nada que ele falar, entendeu?”, afirma.
O sistema de degelo do ATR – modelo do avião que caiu em Vinhedo – funciona como se fosse uma bolsa que infla e esvazia durante o voo, e quebra as camadas de gelo que se formam na parte da frente da asa.
E o bom funcionamento desse sistema é obrigatório e fundamental, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil, para que a aeronave voe em segurança em condições de formação de gelo.
Segundo o ex-funcionário, o voo onde o problema no degelo apareceu, antes do acidente, foi entre Guarulhos e Ribeirão Preto.
O ATR da Voepass saiu de Guarulhos às 0h12 do dia 9 de agosto do ano passado e pousou em Ribeirão perto de 1h.
A aeronave ficou parada por quatro horas e meia, antes de entrar em operação novamente.
“Então, assim, é um período muito curto pra ser feito manutenção na aeronave. Que era a própria diretoria que exigia isso, que queria o avião voando. Então, assim, eles nem pesquisaram”.
De Ribeirão, o avião voou novamente pra Guarulhos. De Guarulhos, seguiu pra Cascavel, no Paraná. Às 11h56, o avião decolou de Cascavel. Poucos minutos antes do pouso, o avião caiu em Vinhedo, no interior do estado. Os 58 passageiros e quatro tripulantes morreram na queda.
Durante as investigações do acidente, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aéreos, CENIPA, emitiu um relatório preliminar que mostra que as caixas-pretas do avião registrou uma conversa entre os pilotos em que mencionam uma falha no sistema de degelo da aeronave.
E a perícia também mostra que os pilotos apertaram o botão para ativar o degelo três vezes.
“Quando na caixa-preta a gente vê que o botão foi acionado, é porque o piloto acionou. Nós vemos três acionamentos. Quando a aeronave cai, ela está com o dispositivo acionado. E muito provavelmente, mesmo tendo o botão sido acionado, o dispositivo muito provavelmente não funcionou.”, afirma Carlos Eduardo Palhares Machado, Diretor do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal.
A Polícia Federal investiga a queda do avião e não comenta a denúncia do ex-funcionário até a conclusão do inquérito.
O que nós precisamos saber, além de identificar quais as causas da queda, é quais são as pessoas que estão diretamente relacionadas a essa queda”, afirma Edson Geraldo de Souza, delegado-chefe da Polícia Federal que investiga o caso.
A Voepass, que teve as operações suspensas após o acidente, não comentou especificamente sobre os problemas alegados pelo ex-funcionário. Em nota, a empresa informou que sempre cumpriu as exigências de segurança e que a frota sempre esteve apta para realizar voos.
A ANAC disse que acompanha a investigação do CENIPA e que analisa os desempenhos de manutenção a partir de auditorias presenciais e remotas. A agência informou ainda que o avião envolvido no acidente estava em condições de operação e com os documentos válidos.
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