Uso indiscriminado de testosterona em mulheres preocupa especialistas

Potencializadas pelas redes sociais, promessas milagrosas para resolver problemas de libido, falta de disposição e manter o tônus muscular escondem sérios perigos. O uso indiscriminado de hormônios como a testosterona, sobretudo em mulheres na menopausa, preocupa especialistas. Esse hormônio só deve ser indicado em situações específicas, com acompanhamento de endocrinologistas ou ginecologistas.“A utilização indiscriminada da testosterona virou uma panaceia no Brasil”, afirma a médica paulista Jacy Alves, especialista em endocrinologia, estilo de vida e obesidade. Ela destaca que nenhuma sociedade médica aprova o uso do hormônio para fins estéticos, melhora de performance física ou prevenção de doenças. A única indicação reconhecida é no tratamento do Transtorno do Desejo Sexual Hipoativo (TDSH) em mulheres na pós-menopausa.Antes da prescrição, no entanto, é necessário um diagnóstico cuidadoso, que leve em conta outros fatores que podem causar queda na libido, como o uso de medicamentos, doenças como hipotireoidismo, problemas renais, depressão ou questões ligadas ao relacionamento afetivo. “Em minha prática clínica de onze anos, nunca precisei repor testosterona, pois normalmente o problema está associado a outros fatores”, diz Jacy. Ela lembra ainda que o hormônio que cai drasticamente na menopausa é o estrógeno, enquanto a testosterona declina de forma discreta e progressiva a partir da terceira década de vida.Efeitos colateraisApesar de seu papel no desejo sexual, os níveis de testosterona no corpo feminino são naturalmente muito mais baixos do que nos homens — em torno de uma proporção de 1 para 10. Quando prescrita sem necessidade ou em doses elevadas, os riscos aumentam: crescimento de pelos, acne severa, alteração irreversível da voz e mudanças no clitóris.

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O abuso pode ainda causar quadros graves como AVC, trombose, câncer de mama e infertilidade. Há também preocupação com o tipo de testosterona utilizada, já que a forma transdérmica — aplicada na pele — não é regulamentada no Brasil. “Não existem, atualmente, formulações de testosterona aprovadas exclusivamente para mulheres em vários países, incluindo o Brasil”, ressalta a especialista Lucy.Acompanhamento e ética médicaA banalização do uso levou entidades como a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo (SBEM) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) a enviarem, no fim de 2023, uma carta à Anvisa pedindo maior controle sobre os implantes hormonais.No texto, as entidades alertam que esses implantes, com exceção do etonogestrel (Implanon) aprovado como anticoncepcional, não têm autorização da Anvisa para uso comercial ou produção industrial. “São manipulados, não possuem bula ou informações adequadas de eficácia e segurança. Os desfechos a longo prazo são desconhecidos”, diz o documento.A ginecologista e sexóloga Patrícia C. Nogueira reforça que a indicação da reposição hormonal precisa ser ética e criteriosa. Muitas vezes, a falta de desejo sexual pode estar relacionada a fatores como sobrecarga de trabalho, rotina doméstica, casamentos longos e pouco estímulo erótico. Outros fatores como déficit de vitaminas, má qualidade do sono e alterações hormonais também entram nesse quadro.Reposição controladaQuando necessária, a reposição hormonal deve ser feita por tempo limitado, em média seis meses, com acompanhamento frequente. “A paciente precisa ser reavaliada em 45 dias ou, no máximo, em até três meses, não pode sumir do consultório”, alerta Patrícia.Ela cita, por exemplo, o aumento significativo nos níveis de colesterol causado pela testosterona, que pode gerar problemas cardiovasculares. Por isso, além de acompanhamento médico, é necessário cuidar da alimentação e manter hábitos saudáveis.

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