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Enquanto os ônibus que servem a Suburbana são velhos e sujos, “e estão sempre atrasados”, ele afirma, os ônibus de outras áreas da cidade são novos, com ar-condicionado, Wi-Fi, segurança e horários regulares – a exemplo do sistema BRT, mas não limitado a ele. “Deixando claro para mim que o transporte público de Salvador é racista”, afirma Jailson categórico.O servidor aponta como a constante retirada de linhas de ônibus para “abastecer o BRT e o metrô”, faz com que a população de bairros periféricos do Subúrbio Ferroviário, por exemplo, fique desassistida, dependendo de baldeações que aumentam o tempo e a distância dos trajetos feitos, muitas vezes, para seus locais de trabalho.”Dificulta a vida, principalmente, de pessoas com deficiência como eu, deixando os trajetos exaustivos, quando tudo que todos nós queremos é um transporte humanizado”, afirma Jailson, que é cadeirante desde os três anos por causa da poliomielite.Doutor em arquitetura e urbanismo, Daniel Caribé explica que o que conecta os bairros de classe média aos bairros periféricos de Salvador são duas coisas: a necessidade de mão de obra e o transporte público.”É graças ao transporte público, contraditoriamente, que a gente consegue manter uma cidade segregada. É daí que vem o caráter racista do transporte público em si, mas a mobilidade urbana não é só isso. Ela envolve acessibilidade, caminhadas, bicicletas e veículos particulares, e podemos encontrar racismo em todos eles”, aponta Daniel.Tema em debate
Debate propõe repensar como o racismo estrutural afeta o direito
de ir e vir
| Foto: Raphael Muller / Ag. A TARDE
Daniel Caribé é membro do ObMobSSA e do Instituto Equicidades, organizadores da Semana da Mobilidade Antirracista, que teve início na última ontem, na Uneb, e segue até a próxima quinta-feira, com palestras e cursos acontecendo também na Ufba e na Câmara Municipal de Salvador – confira a programação no www.obmobsalvador.org.Segundo ele, levar o assunto para ser discutido com a população, sobretudo dentro de universidades, é essencial pois o racismo ligado à mobilidade urbana é um assunto facilmente engolido por outros debates (também necessários) em torno da mobilidade, como greves, paralisações e aumento de tarifa, além de mudanças nos modais.Um dos convidados do evento é o mestre em antropologia, Paique Santarém, também doutor em arquitetura e urbanismo. Um dos pesquisadores que, junto a Daniel Caribé, publicou o livro “Mobilidade Antirracista”, Paique explica que a importância de discutir esse assunto está em tirar do óbvio os debates sobre racismo e mobilidade, assim como tirar da invisibilidade o debate desses dois assuntos juntos.”Se a gente fala que toda a nossa sociedade tem problemas com as relações sociais, de classe e de gênero, vale a pena a gente entender como isso está presente nas instituições. Presente em todas elas, desde a saúde até a mobilidade. Trazer isso para a universidade ajuda a decifrar, entender e buscar soluções”, afirma.Negro, periférico e motorista do setor público, Márcio Antônio Prudente Maltez usa ônibus e metrô para se movimentar em Salvador, onde ele acredita que seria possível, por exemplo, implantar a Tarifa Zero (transporte gratuito), que já é realidade em cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Ceará.”Isso faria muita diferença. A sociedade civil precisa debater mais sobre um transporte público antirracista. A população precisa debater, dar sua opinião e demonstrar sua insatisfação com a qualidade do serviço de transporte público, que hoje é caótico e não esconde a diferença que é pegar um ônibus na periferia e nos bairros nobres”, afirma Márcio.