Kátia e Fernanda Luz, mãe e filha, se uniram para fundar a sorveteria artesanal, Gelato Luce
| Foto: Denisse Salazar | Ag. A TARDE
A Gelato Luce também foi fundada a partir de um hobby. “Quando começou a pandemia, eu trabalhava como executiva de uma multinacional em São Paulo, após 15 anos no exterior. Com o home office prolongado, Fernanda ficou inquieta e quis criar um negócio para ocupar o tempo. Sempre amamos sorvete e, em casa, desenvolvíamos receitas e testávamos sabores. Ainda em São Paulo, comecei a criar nossa torta de sorvete e mandar para amigos. Vim para Salvador e acabei saindo da empresa, o que me fez perceber que não queria mais aquela vida louca de executiva e que empreender estava no meu DNA”, expõe KátiaJá a Start Solidarium nasceu da necessidade de recomeçar. “Antes de fundarmos a Start Solidarium, eu tinha a Glamour Decor, especializada em artefatos para eventos, e minha mãe, a Luz Empresarial, de consultoria. Durante a pandemia, os dois negócios foram interrompidos. Nesse período desafiador, desenvolvemos uma forma inovadora de reciclar isopor. Percebemos que era melhor seguir um novo caminho e assim nasceu a empresa”, conta Lucas.Especialistas de mercado apontam que o profundo senso de pertencimento dos membros da família pode favorecer os negócios, com a tomada de decisões rápidas, forte comprometimento com a empresa e resiliência nos momentos de crise. De acordo com Raquel Teixeira, líder de Family Enterprise da consultoria EY, essa conexão pode gerar uma cultura de cuidado, confiança e resiliência, que são atributos fundamentais em contextos de incerteza ou transição. “Outra vantagem é a visão de longo prazo, menos orientada por resultados trimestrais e mais comprometida com a sustentabilidade e a perenidade do negócio ao longo de gerações”, acrescenta.No entanto, essas mesmas características podem trazer desafios importantes. O primeiro deles é a dificuldade em separar as dimensões da família e da empresa, o que pode resultar em conflitos pessoais sendo levados para o ambiente corporativo, ou decisões de negócios contaminadas por emoções.Para mitigar os riscos, Teixeira recomenda manter uma organização básica: definir quem toma quais decisões, registrar acordos importantes, criar o protocolo de família, estabelecer uma rotina mínima de prestação de contas e garantir a separação entre o patrimônio pessoal e o caixa da empresa. É o que fazem, por exemplo, Luciana e Lucas, da Start Solidarium, com uma divisão do trabalho bem estabelecida. “As decisões estratégicas e o processo criativo de novos produtos são feitos em conjunto. No dia a dia, minhas responsabilidades se concentram em vendas, atendimento, apresentações e reuniões com parceiros e clientes. Já Lucas cuida da produção da matéria-prima, do processo de colorificação e do controle de estoque”, explica Luciana.Habilidades de cadaUma forma eficaz de divisão é colocar em prática as habilidades de cada membro da família, como explica Patrícia Guimarães: “Dividimos as funções de maneira bem natural e flexível, respeitando as melhores habilidades de cada uma. Eu fico à frente da produção e gestão de pessoas, enquanto minhas filhas cuidam da parte mais estratégica e criativa, como o financeiro e o marketing nas redes sociais, trazendo um olhar jovem e inovador para a empresa”.É preciso também estar atento para que os negócios não acabem prejudicando a relação materna. “Estabelecemos um respeito muito grande no ambiente de trabalho. Lá, somos sócias que tomam decisões juntas; em casa, voltamos a ser mãe e filha, com todo o carinho e companheirismo de sempre. É claro que nem sempre concordamos com tudo, mas conseguimos lidar de uma maneira leve que não atrapalha a relação”, afirma Fernanda Luz. “O equilíbrio está em ter consciência de que cada momento exige uma postura diferente, mantendo sempre o respeito”, completa Géssica Oliveira.Nesse processo, o cuidado com a comunicação é fundamental, como explica Bianca Aichinger, sócia da Quantum, consultoria de gestão de empresas. “Entre familiares, as expectativas tendem a ser mais altas e dar feedbacks construtivos pode ser mais difícil. É importante focar no caminho de sucessão, uma motivação por parte dos filhos em ajudar a construir o crescimento da empresa, mantendo o legado da família”, diz ela.Raquel Teixeira, da EY, afirma que criar momentos regulares, ainda que informais, para discutir o presente e o futuro da empresa com objetividade e respeito fortalece os vínculos e antecipa soluções para desafios que poderiam se transformar em rupturas. “Por fim, entender que o negócio precisa evoluir junto com o seu mercado é um diferencial. À medida que a empresa cresce, o investimento em conhecimento, melhoria de processos, digitalização e desenvolvimento da próxima geração pode garantir não apenas a continuidade, mas também a capacidade de inovar e prosperar com raízes firmes e visão de futuro”, acrescenta.Mães e filhos empreendedores garantem que, se há respeito, diálogo e objetivos alinhados, essa jornada pode ser maravilhosa. “A convivência no trabalho fortalece ainda mais nossa relação, porque compartilhamos sonhos, vitórias e também desafios”, dividem Amanda e Giovanna Guimarães. “Os benefícios são muitos: trabalhar com quem amo, confio e admiro”, afirma Géssica Oliveira. Para Lucas Luz, trabalhar com quem ele conhece tão bem é um facilitador. “Além de ser extremamente confiável, ela entende meu comportamento, minhas forças e fraquezas. Isso faz com que saiba exatamente como me apoiar, me dando segurança para arriscar e tentar coisas novas na empresa”, diz ele.*Sob supervisão da editora Cassandra Barteló.