Assembleia define diretrizes para a desocupação do prédio
| Foto: Raphael Muller/ Ag. A TARDE
Para o diretor do movimento, Carlos Alberto Araújo dos Santos, o grupo deixa o imóvel com um saldo positivo. Ele esclarece que, apesar do recuo na decisão de continuar com a ocupação, não significa que a ‘luta’ esteja perdida. O grupo, com cerca de 600 famílias, está ocupando o espaço desde o dia 31 de maio. “Estamos dando dois passos atrás, para avançar quatro. Nós vamos sair de forma ordenada, civilizados, sem que ninguém toque no fio de cabelo de vocês. Porque o maior objetivo, que eu acredito, não é morar em um prédio que não tem estrutura digna para que vocês possam dizer: ‘minha casa’. O maior objetivo, é fazer o que fiz. Chamei a atenção de todos e saí dizendo: ‘pelo menos, agora, tenho 100 unidades de Minha Casa, Minha Vida para distribuir com vocês'”, afirmou Santos, em assembleia, revelando que as unidades serão administradas pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur).
Bandeira do movimento tremula do alto do prédio, que fica em área nobre de Salvador
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Ainda segundo o diretor, durante os 12 dias de mobilização, aconteceram várias tratativas e, entre estas, um acordo firmado com uma grande empresa de e-commerce. “São 600 vagas que o Mercado Livre vai absorver de todo o pessoal que nós vamos indicar. Uma parceria que nós estamos fazendo alinhada com o gorverno do Estado, através da Casa Civil”, revelou o homem.Carlos Alberto reitera que a decisão de deixar o empreendimento abandonado parte da imposição da Justiça e da aplicação de uma multa diária. “Nós procuramos de todas as formas dialogar com o governo, alinhar com o nosso jurídico para tentar derrubar [liminar]. E nós entramos com quatro recursos, todos eles, nós perdemos. Eles [advogados dos donos do imóvel] entraram com agravo eo juiz determinou a desocupação ou teremos que pagar uma multa de 50 mil reais, dia. Então, no meu entendimento, não é bom que a gente aposte na sorte”, declarou o representante do MSMC.Despedida e lamento
Dona Raimunda vai voltar a morar em Itapuã, em uma área de risco
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A vendedora Raimunda Santos da Silva, 63 anos, é uma das pessoas que terá de sair do imóvel, na manhã desta quinta-feira. Abalada com a notícia, ela estava preocupada com os demais companheiros que não terão para onde retornar.”Minha filha, a gente tem que aceitar, né? Eu ainda tenho para onde voltar. Moro próximo a um brejo, em uma área de risco. Quando chove, a água chega no meio da parede. Mas, graças a Deus, tenho para onde ir. E quem não tem? Muita gente não pode mais pagar aluguel, nem tem para voltar”, lamentou a idosa, que mora no Alto do Coqueirinho, em Itapuã. Uma das pessoas que está sem saber o que fazer depois de deixar o acampamento é dona Sandra Vicente, 66. Pessoa cega e moradora do Jardim das Margaridas, ela lembra que, antes de chegar ao prédio, vivia de favor na casa de um conhecido.
[ao fundo] Dona Sandra, que é cega, não sabe para onde ir quando deixar a ocupação
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“Agora, só Deus. Nós temos que nos preparar para procurar a pessoa que eu estava [morando] ou procurar algum lugar para ficar. No momento, não tenho para onde voltar. Tem que ser assim, né? Nós temos que ser realistas e continuar a luta. Eu, particularmente, estou sozinha. Aqui, nós temos alimentação, nós estamos vivendo um ajudando o outro, virou uma comunidade. Nós entramos com esperança e estamos saindo com esperança que tudo vai melhorar, que tudo vai acontecer da melhor forma possível porque nós somos fiéis”, disse a idosa, acreditando em um futuro melhor.Logo após a reunião, encontramos a dona de casa Patrícia Sousa Santos, 41. Com os olhos marejados, ela seguia para o quarto, onde está morando há dez dias com o esposo e a filha caçula, de 4 anos, para a arrumar os pertences da família.No último dia 2 de junho, Patrícia já havia conversado com o Portal A TARDE e, diferente desta quarta-feira, falou sobre a esperança de conseguir uma casa melhor para criar a pequena Hadassah. Elas moram no Bairro da Paz.
Patrícia chora ao lembrar que muitas pessoas não terão para onde ir após deixar a ocupação
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Assim como dona Raimunda, a dona de casa também demonstrou preocupação com os demais integrantes do movimento. “Hoje, estou triste, muito triste. Por saber que eu vou e por, petititico ou não, eu tenho um lugar para morar. Triste por aqueles que não têm [casa] e estão na rua, muitos morando de favor, outros estavam morando de aluguel e não tem mais dinheiro para pagar”, lembrou.
Patrícia arruma os pertences da família para deixar a ocupação nesta quinta-feira, 12
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“Enquanto estávamos aqui unidos, um ajudava o outro, um acolhia o outro. Mas, saber que nos todos vamos voltar para nossa realidade é muito triste. A realidade de não ter ajuda, a realidade de precisar, e muitos ter para ajudar e não ajudar. A realidade de saber que onde você mora não pode colocar a cara para fora porque é tiro para tudo que é lado. Só de saber disso, é muita tristeza”, finalizou a mulher.
Acolhimento provisórioQuestionado para onde serão encaminhadas as pessoas que não têm para onde ir, o diretor Carlos Alberto revelou que busca apoio com o governo do estado.”Bom, eu tenho perguntado ao governo o que a gente vai fazer com esse pessoal. Nas duas, uma. Ou elas voltam para onde estavam ou, de imediato, a única coisa que eu vejo e enxergo é sai dessa ocupação [hotel] e nós vamos fazer outras ocupações. Eu, particularmente, vou lutar para acolher essas mulheres, para dar a segurança e a estabilidade de moradia, mesmo que provisoriamente, para não deixar essas mulheres na rua”, assegurou Santos.
Assembleia
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Segundo ele, na próxima semana, representantes do Movimento Social de Luta por Moradia e Cidadania da Bahia se reunirão com a secretária Estadual de Desenvolvimento Urbano (Sedur), Jusmari Oliveira, para alinhar os próximos passos a serem tomados com relação aos 100 imóveis que deverão ser disponibilizados com a intervenção do órgão.”Nós teremos uma reunião amanhã, uma força-tarefa com o governo do Estado, mas já está marcado na próxima semana uma reunião com a secretária Jusmari [Sedur] para a gente discutir essas unidades que serão garantidas para essas mulheres desse movimento”, reafirmou Carlos Alberto.Secretaria de Desenvolvimento UrbanoProcurado pelo Portal A TARDE, o órgão do governo se pronunciou por meio de nota encaminhada pela a assessoria de comunicação.”Sobre o assunto mencionado, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur) acompanha com atenção as demandas habitacionais no estado e mantém diálogo constante com os órgãos competentes e movimentos sociais. No momento, ainda não há definição oficial sobre a destinação de unidades habitacionais para esse caso específico.
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Qualquer informação concreta será comunicada de forma institucional e no tempo adequado. A secretária Jusmari reforça: ‘estamos sempre atentos às necessidades da população e dialogando com os setores envolvidos para buscar soluções dentro das possibilidades do governo”.
A reportagem também tentou contato com a Casa Civil, mas, até a publicação dessa matéria, não obteve retorno.