Um bom puxão de orelha nos deputados e senadores

Acredite que nunca vi deputado ou senador ligar para a opinião popular fora do período em que vai buscar voto para se reeleger. Mas, neste instante parece que colocaram rojões e cobrinhas juninas dentro das suas cuecas e os eggs estão pegando fogo. Foi um tsunami de vídeos e publicações nas redes sociais que reacendeu o debate sobre os limites entre crítica política e ataques institucionais. Foi algo inesperado, mas que se trata de algo criativa, sim. A campanha, surgida após a derrubada do aumento do IOF pelo Congresso, gerou reações de parlamentares, do governo e de partidos de diferentes espectros ideológicos. Causou incômodo como nunca se viu nas últimas décadas.Mas por trás da gritaria por “moderação” e “respeito entre os Poderes”, há um ponto que precisa ser encarado com honestidade: as críticas partem com força, sobretudo da esquerda, mas refletem um sentimento antigo e persistente do povo brasileiro — o profundo descontentamento com o comportamento recorrente de deputados e senadores. E agora a Inteligência Artificial veio materializar com criatividade e força audiovisual o sentimento reinante.Os vídeos denunciam a postura do Congresso como contrária aos interesses populares. O estopim, a senhora já sabe, foi a decisão da Câmara dos Deputados de barrar o aumento do IOF, medida defendida pelo governo como uma forma de financiar a transição tributária com foco em justiça social. Em resposta, os petistas lançaram materiais defendendo que os super-ricos contribuam mais. A oposição retrucou com sua própria campanha, alegando a criação de um “nós contra eles” por parte do governo. Em seguida, vídeos sem autoria identificada passaram a retratar o Congresso como “inimigo do povo”. A reação veio rápida, especialmente do presidente da Câmara, Hugo Motta, que se disse alvo de ataques e acusou o governo de estimular a polarização.Mas será mesmo exagero afirmar que o Congresso age muitas vezes contra os interesses populares? A história mostra o contrário. Por décadas, o Legislativo tem sido palco de escândalos de corrupção, fisiologismo, troca de favores, orçamento secreto e medidas que favorecem poderosos enquanto empurram a conta para os mais pobres. O clamor que agora ecoa nas redes sociais não nasceu de um vídeo de IA, mas de um acúmulo secular de frustrações. O PT está certo? O Governo está certo? Estão também errados, qualquer estudante de economia sabe que gerar mais impostos não leva a lugar nenhum. Os pobres, que são o sentido do apelo da campanha esculhambativa (lá vem eu de novo com neologismo, desculpe) ao Congresso Nacional serão os mais atingidos. Se sobe o IOF, os juros ficam lá no alto e os juros atacam quem deve, por exemplo, cartão de crédito ou empréstimo – os pobres e a classe média. O governo tem de tomar vergonha na cara e efetuar a reforma estruturante para acabar com a sangria dos recursos do país. O IOF não representa justiça tributária.Políticos agora pedem equilíbrio e dizem combater a polarização. Porém, ignoram o fato de que boa parte da sociedade vê o Congresso com descrença justamente por conta da prática política que ele representa. Quando um deputado fala em nome do “interesse nacional” para defender a derrubada de um imposto — ainda que controverso —, mas silencia diante de privilégios, verbas milionárias e medidas impopulares aprovadas na calada da noite, a crítica não é apenas legítima: é necessária.Não existem inocentes. O Congresso é culpado de ter aproveitado a situação mais para sabotar o governo do que para proteger os pobres. Afinal, onde está a mesma disposição em discutir com seriedade uma reforma tributária progressiva, que atinja lucros, dividendos, grandes fortunas e heranças bilionárias? Não estou defendendo ataques pessoais nem agressões gratuitas. Mas a crítica é bem-vinda. Não o desrespeito. Entretanto, o coro popular às artimanhas da “comunicação” engrossa a motivação. Sinceramente não dá mais para tolerar um Parlamento que opera à margem do que esperam os eleitores.Veio no momento certo o Congresso Nacional ter levado um puxão de orelha. Não por birra ideológica, mas porque tem feito por merecer. Estão incomodados com o espelho? Mudem a imagem. Mania danada de culpar o reflexo! Nem sei se coloco na conta de Freud ou Lacan. Os políticos do executivo e do legislativo estão se passando por doentes. Querem enganar a quem?*Jolivaldo Freitas é escritor, jornalista e radialista. Autor do livro: “Manual Sintético e Minimalista Para Entender Um Pouco de Política e Ideologia”.
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