‘Ausência de debate é muito grave’, analisa especialista sobre votação em urgência de pacote fiscal de Adriane Lopes


Especialistas alertam que a falta de análise pode fragilizar leis fiscais e gerar dúvidas sobre critérios de classificação de dívidas. Os projetos foram aprovados em menos de uma hora, na Câmara da capital. Fachada Câmara de Vereadores de Campo Grande
Reprodução
Em menos de uma hora, nesta terça-feira (8), a Câmara Municipal de Campo Grande aprovou três projetos de lei da prefeita Adriane Lopes (PP). As medidas têm como objetivo ajustar as contas públicas da cidade e garantir equilíbrio fiscal.
Especialistas em direito tributário alertam para os riscos da aprovação rápida dos projetos, considerados complexos. O g1 ouviu dois advogados que apresentaram pontos de vistas sobre as decisões tomadas pelos vereadores.
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A falta de discussão e aprovação de leis estruturantes sem uma análise mais aprofundada são tópicos analisados pelo especialista em direto tributário Sebastião Rolon.
“O Legislativo se equivoca quando não debate o tema, especialmente temas complexos. É preocupante e grave quando há regime de urgência. Não é tão fácil analisar esses tipos de projetos”, explicou o advogado tributarista.
Segundo Rolon, quando os projetos estão conectados a outras leis, a ausência de uma análise detalhada pode enfraquecer o sistema jurídico e criar espaço para situações imprevisíveis.
Os projetos seguem diretrizes do Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal e do Plano de Promoção do Equilíbrio Fiscal (PEF). Veja abaixo os temas de cada proposta aprovada:
Projeto de Lei nº 29 (Teto de Gastos): Limita o aumento das despesas primárias;
Projeto de Lei nº 27 (Leilões): Autoriza a adesão a programas federais e a realização de leilões de pagamento;
Projeto de Lei nº 28 (Conta Única): Centraliza a gestão financeira da prefeitura em uma conta única.
O advogado tributarista Daniel Pasqualotto avalia que o projeto sobre leilões e programas federais exige maior cuidado, especialmente durante o processo de votação.
“Isso quer dizer que o município de Campo Grande pode inquirir seus credores a receberem menos e, caso um ou mais aceite reduzir seus recebíveis, podem ser contemplados com o ‘pagamento’. Do ponto de vista jurídico, pode haver questionamentos sobre os critérios adotados na classificação das dívidas”, explicou.
Daniel também alerta que, do ponto de vista moral, pode haver críticas à prática de descontos em dívidas decorrentes de serviços já prestados ao município, que deveriam ser pagas integralmente. “Nos resta aguardar as regras que serão adotadas pelo executivo municipal na regulamentação dos tais leilões de pagamento”, afirma.
Pasqualatto comenta também sobre o projeto de Lei de n. 29, que limita o crescimento anual da despesa primária à variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). “Essa métrica é largamente utilizada, inclusive, pelo executivo federal, sendo que em casos de deflação o orçamento se limita ao valor final (teto) do exercício imediatamente anterior”, finaliza.
o g1 entrou em contato com a prefeitura para comentar sobre os projetos aprovados. Porém, até a última atualização desta reportagem, nenhum retorno foi enviado.
Sobre a votação
Antes da votação, o presidente da Câmara de Campo Grande, vereador Papy (PSDB), pediu votos aos colegas e afirmou que a os projetos de lei são “importantes para manter a saúde financeira” da capital e possibilitar o acesso à recursos nacionais.
“Nós temos uma tarefa de compromisso de Campo Grande, que é de ajustar as contas financeiras da capital. este projeto visa ajustamento fiscal. […] As leis vão dar o instrumento ao Executivo para ter o acordo com o Tesouro Nacional. […] Foi a analisado pela procuradoria e peço que votem”, detalhou Papy.
As propostas chegaram à Câmara e tramitaram em regime de urgência. Em pouco mais de uma hora, os projetos foram analisados pelas comissões, discutidos em plenário e aprovados. O único ponto de entrave durante a sessão foi o veto à emenda a um dos projetos proposta pelos vereadores Lívio Leite (União) e Luiza Ribeiro (PT), que foi derrubada.
Entenda sobre os projetos aprovados
Projeto de nº 29
O Projeto de Lei nº 29 propõe limitar o crescimento anual dos gastos públicos ao índice da inflação (IPCA). A regra será aplicada se o município aderir ao Plano de Promoção do Equilíbrio Fiscal (PEF), que propõe acesso a créditos da União se as contas municipais forem equilibradas.
O valor do limite será calculado com base no orçamento do ano anterior, atualizado pelo IPCA acumulado até dezembro, conforme o texto do PL. Se houver deflação, o limite será o mesmo do ano anterior. A medida só vale enquanto durar o PEF. Veja abaixo outros pontos do PL:
Controle de gastos: a proposta busca controlar o aumento das despesas e garantir equilíbrio nas contas públicas;
Muitas exceções: despesas com saúde, educação, transferências obrigatórias e outras áreas ficam fora do limite;
Validade temporária: a regra só vale enquanto o município estiver no programa federal.
O projeto foi aprovado com 23 votos favoráveis e 3 contrários.
Projeto de nº 27
O Projeto de Lei nº 27 autoriza a prefeitura a aderir ao Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal e ao Plano de Promoção do Equilíbrio Fiscal (PEF). A adesão permite alinhar as finanças municipais às regras da União, além de ampliar o acesso a crédito com garantia federal.
O texto também autoriza a realização de leilões de pagamento. A ideia é quitar dívidas atrasadas com fornecedores, usando como critério o maior desconto oferecido. Precatórios não entram nessa regra.
Mais crédito e transparência: segundo o PL, a adesão aos programas federais permite ampliar o acesso a financiamentos da União;
Metas rígidas: para manter o acesso ao crédito, o município vai precisar cumprir metas anuais do próprio governo federal.
O projeto foi aprovado por unanimidade.
Projeto de nº 28
O Projeto de Lei nº 28 propõe centralizar toda a gestão financeira da Prefeitura de Campo Grande na Secretaria Municipal da Fazenda, da secretária Márcia Okama. A medida inclui à administração os órgãos diretos, autarquias, fundações e empresas públicas.
De acordo com o texto, será criado um sistema de Conta Única, que reúne os recursos municipais em uma única conta bancária de aplicação, independentemente da origem do dinheiro.
Recursos em único local: a gestão tem como objetivos principais manter saldo suficiente para cumprir os compromissos da prefeitura, garantir que o Tesouro Municipal tenha os valores necessários para os pagamentos e buscar melhores rendimentos para o dinheiro público, por meio da aplicação dos recursos;
Superávit: segundo o texto, o fim de cada ano, o saldo positivo (superávit financeiro) das autarquias e fundações será transferido para o Tesouro Municipal e contabilizado como recurso ordinário.
O projeto de lei foi votado com 25 votos favoráveis e 1 contrário.
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