
Policiais em equipamento antimotim marcham em frente ao Domo da Bomba Atômica (ao fundo, à esquerda) enquanto protegem a área um dia antes das cerimônias que marcam o 80º aniversário do primeiro bombardeio atômico do mundo, na cidade de Hiroshima, província de Hiroshima, em 5 de agosto de 2025
Richard Brooks/AFP
O Japão recorda nesta quarta-feira (6) os 80 anos do lançamento da bomba atômica sobre Hiroshima, que até hoje ainda é motivo de forte estigmatização contra os sobreviventes do horror do ataque nuclear.
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Em 6 de agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram uma bomba atômica sobre a cidade de Hiroshima, matando cerca de 140 mil pessoas. Três dias depois, uma bomba semelhante atingiu Nagasaki, causando a morte de aproximadamente 74 mil pessoas.
Esses dois ataques, que aceleraram o fim da Segunda Guerra Mundial, são os únicos casos na história em que armas nucleares foram usadas em tempos de guerra.
Os moradores das duas cidades que sobreviveram às bombas viram suas vidas mudarem drasticamente. Foram apontados, estigmatizados e marginalizados.
Como explica Matsuyoshi Ikeda, que tinha 7 anos em agosto de 1945, “muitos sobreviventes dos bombardeios tiveram grandes dificuldades para encontrar trabalho”.
“Como foram expostos à radiação, as empresas desconfiavam deles. A maioria dos empregadores achava que não seria uma boa ideia contratá-los, pois não seriam funcionários confiáveis. Poderiam se ausentar com frequência por problemas de saúde graves, como câncer ou leucemia, causados pela radiação”, diz.
As mulheres também foram vítimas de discriminação, como confirma Tomoko Matsuo, de 92 anos.
“Felizmente não foi o meu caso, mas os estudos comprovam de forma incontestável que muitas sobreviventes nunca conseguiram se casar”, relata a idosa.
“Os homens imaginavam que, por causa da radiação, elas seriam inférteis. Ou que só poderiam dar à luz bebês frágeis, com saúde debilitada ou malformações, faltando dedos, por exemplo.”
‘Discriminação de Estado’
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Milhares de moradores de Hiroshima e Nagasaki que estavam nas cidades nos dias 6 ou 9 de agosto de 1945, respectivamente, não são oficialmente reconhecidos como vítimas dos bombardeios atômicos. Isso porque não conseguiram provar que estavam próximos ao ponto de impacto das bombas, dentro do perímetro restrito definido pelo governo, onde a radiação foi mais intensa.
Para as autoridades, essas pessoas apenas viveram a “experiência dos bombardeios atômicos”, mas não sofreram com eles. Por isso, não têm direito ao acesso gratuito aos cuidados médicos, ao contrário das vítimas oficialmente reconhecidas. Em ambas as cidades, isso é visto como uma “discriminação de Estado”.
“Essa discriminação geográfica não faz sentido, já que até pessoas que estavam a dois quilômetros do ponto de impacto foram afetadas pela radiação”, afirma o prefeito de Nagasaki, Shiro Suzuki.
Durante as comemorações, as vítimas dos bombardeios vão exigir que as autoridades acabem com essa discriminação. A associação Hidankyo, que reúne os sobreviventes e recebeu o Prêmio Nobel da Paz no ano passado, também fará esse apelo.
Há anos, a cidade de Nagasaki pressiona o governo para corrigir essa situação com urgência, pois os sobreviventes não reconhecidos estão envelhecendo e muitos enfrentam sérios problemas de saúde e precisam de ajuda imediata.
“Da minha parte, não vou ceder e continuarei a insistir junto às autoridades para que mudem sua posição”, reforça o prefeito.
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Cerimônia de 80 anos
Cerimônia em homenagem às vítimas da bomba atômica de Hiroshima
Kyodo/via REUTERS
Representantes de 120 países e regiões, além da União Europeia, confirmaram presencça na cerimônia organizada nesta quarta-feira (6) em Hiroshima, segundo autoridades locais.
A França será representada pelo número dois da embaixada nas duas cerimônias, em Hiroshima e em Nagasaki, no sábado.
No entanto, potências nucleares como Rússia, China e Paquistão não enviaram equipes. O Irã, acusado de tentar desenvolver armas nucleares, confirmou o envio de um representante.
O Japão informou que não “escolheu seus convidados” para essas comemorações, mas apenas “notificou” todos os países e regiões sobre o evento. Assim, Palestina e Taiwan, que o Japão não reconhece oficialmente como países, anunciaram sua presença pela primeira vez.
“A existência de líderes políticos que querem aumentar seu poder militar para resolver conflitos, inclusive por meio da posse de armas nucleares, dificulta a construção da paz mundial”, declarou na semana passada o prefeito de Hiroshima, Kazumi Matsui, referindo-se às guerras na Ucrânia e no Oriente Médio.
Hoje, Hiroshima é uma metrópole próspera com 1,2 milhão de habitantes, mas as ruínas de um edifício com a estrutura metálica de um domo permanecem no centro da cidade, como lembrança do horror do ataque.
“É importante que muitas pessoas se reúnam nesta cidade atingida pela bomba atômica, pois as guerras continuam acontecendo pelo mundo”, afirma Toshiyuki Mimaki, copresidente da Nihon Hidankyo, grupo de sobreviventes da bomba e vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 2024.
A Nihon Hidankyo pede que os países atuem para eliminar as armas nucleares, com base nos testemunhos dos sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki, conhecidos como hibakusha.
“Espero que os representantes estrangeiros visitem o Museu Memorial da Paz e compreendam o que aconteceu sob a nuvem atômica em forma de cogumelo”, declarou Mimaki.
No sábado, Nagasaki também espera um número recorde de países presentes em suas comemorações, incluindo a Rússia, que participará pela primeira vez desde a invasão da Ucrânia em 2022.
A decisão de Nagasaki, no ano passado, de excluir o embaixador de Israel das comemorações levou o embaixador dos Estados Unidos no Japão a boicotar a cerimônia. A cidade explicou que a decisão “não foi motivada politicamente”, mas sim uma medida de segurança contra possíveis distúrbios, como manifestações relacionadas ao conflito no Oriente Médio e em Gaza.
“Este ano, queremos que os participantes venham e vejam diretamente a realidade da catástrofe que uma arma nuclear pode causar”, declarou um representante de Nagasaki à AFP.
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