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“Hoje eu não tenho muito aquela coisa de ‘eu gosto mais disso ou daquilo’. A gente se prepara em todas as áreas. Mas eu comecei na trocação, né? Eu venho do taekwondo, venho do Muay Thai. Então a gente gosta de sair na porrada em relação a isso. Mas o que a luta desenrolar lá na hora, a gente tá preparado e pronto pra tudo”, diz.”Ele (Walker) é mais do grappling, né? O que a gente viu muito dele é que ele busca muito o grappling na luta. Eu treino com o Malhadinho, que é do grappling. Então, em relação a isso, não me assusta, não. Choca sempre porque eu gosto da trocação e ele é o cara que busca o grappling. Então é meio que algo diferente ali”, completa.A vontade pela porrada, no entanto, não acompanha o jeito pelo qual ele quer ser conhecido no mundo, principalmente agora que ocupa o holofote da luta mundial: “Eu sou um cara super gente boa. Um cara muito de fé, religioso, cristão. Quero que me conheçam assim. Talvez pela minha cara de mau, tenha gente que acha que eu sou mau, mas é totalmente diferente. Que me conheçam como um cara super gente boa, que é o que eu sou”, diz.
Card do UFC Rio
| Foto: Divulgação I UFC
Sonho de criançaQuando se é criança, a vida de quase todas as pessoas da mesma idade é igual. Escola, dever de casa, brincar, ajudar a mãe em casa, descansar. À medida que o tempo passa, cada um começa a fazer suas próprias escolhas, se encaminhando para a maior delas – a profissão que seguirá. É a profissão escolhida por cada um que determina os espaços que aquela pessoa ocupará, como será sua rotina e seus sonhos dali em diante. Por vezes, a família apoia completamente a escolha – em outras, nem tanto. Para Raffael Cerqueira, as duas coisas aconteceram, em meio às decisões que mudaram sua vida. Desde muito pequeno, Raffael sempre amou praticar esportes. Assistindo a filmes de luta na televisão, começou a fazer aulas de esportes de contato, se aventurando no karatê, na capoeira, no boxe e em toda oportunidade que surgisse. Inicialmente, tudo era uma grande diversão, até que, aos 17 anos, conheceu o Muay Thai e viu ali uma oportunidade de trabalho. Decidido a lutar, ele começou a se desenvolver na arte, mergulhando cada vez mais no mundo da luta – mas ainda sem encontrar seu destino final.Caminho do MMAFoi então que, cinco anos depois, acompanhando um primo, descobriu os treinos de MMA. Sentado no banco assistindo, Raffael foi notado pelo mestre Tiago Jacaré, que perguntou se ele não tinha interesse em tentar. Com a resposta positiva, disse que marcaria uma luta para ele – a primeira das infinitas que ele dedicaria a vida a lutar.Em casa, a avó e matriarca de uma família muito cristã não gostava da ideia de luta. Com a ideia de violência em mente, era contra a prática do MMA, o que levou Raffael a esconder a profissão da avó por um bom tempo. A paixão, no entanto, não se escondia dele. Não demorou até que o caminho na luta ficasse mais firme – no MMA, começou a sonhar com o Ultimate Fighting Championship, o UFC, e decidiu dar tudo em prol dele.
Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Raffael Cerqueira (@raffaelcerqueira_ufc)Raffael largou trabalho, largou faculdade, focou na luta e foi contar à família. “Minha avó me falou para não parar. Foi o momento mais marcante da minha carreira pra mim. Ela falou: ‘Ó, meu filho, você sabe que eu não gosto disso. Eu acho violento e tal. Mas se é o que lhe afasta da rua, do que é ruim, continue. Vá no seu caminho que a coisa vai dar certo'”, conta.”Isso me marcou muito. Meu pai me apoia muito, minha mãe também me apoia muito. No Brasil não tem negócio de ajuda, não tem nada disso. É cada um por si e tal. Graças a Deus, no meio do caminho, Deus sempre colocou pessoas muito boas na minha vida pra me ajudar muito nesse quesito”, continua. Nasce um filho e um lutadorAlém dos pais e da avó, Raffael contou com o apoio da família que criou, principalmente após a pandemia, quando seu filho nasceu. “Quando meu filho nasceu, a mãe dele chegou pra mim e falou: ‘Velho, foca na sua luta. Deixa comigo aqui, não vai faltar nada pra ele'”, conta.”Eu queria largar a luta pra poder cuidar de meu filho. Precisava trabalhar, gerir dinheiro e tal. E ela: ‘Não, velho. Continua que pra ele não vai faltar nada’. E aí foi uma força que me deu, que eu falei: ‘Se ela tá me ajudando nisso aqui, não tem porque eu parar'”, explica.Na época em que o filho nasceu, Raffael não podia lutar, justamente pelo isolamento social da pandemia de Covid-19. “Não tinha trabalho, tudo fechado, o bicho pegando. Eu não tava conseguindo gerir dinheiro, porque eu não trabalhava, eu só vivia da luta”, relata.”Hoje que ele já é mais velho, gosta até de luta. Fala pra mim todo dia que vai entrar no UFC com 20 anos e vai ser campeão. Lá no Brasil, depois que ele nasceu, todas as vezes em que eu fui lutar, ele estava presente. Todas. Ele gosta muito. Tem cinco anos de idade e já faz jiu-jitsu, mais ou menos como eu comecei também”, diz.
Rafael Cerqueira, lutador baiano do UFC
| Foto: Reprodução I Instagram
Desilusão e retornoO caminho foi longo. Nos primeiros três anos após o nascimento do filho, o apoio continuava chegando de todos os lados, alinhando tudo para que o futuro de Raffael desse certo. “Meu empresário, minha equipe, meu preparador físico… eu não tinha preparador físico. Meu corpo é muito diferente antes e depois da preparação física, e eu consegui isso através de Minotaurinho, um cara que tem um coração enorme e ajuda muita gente mesmo. Sou muito grato a isso”, conta. Foi assim que, aos poucos, Raffael foi avançando. No entanto, entre mil esforços e a grande luta para poder lutar, os frutos não pareciam chegar. “Pensei em desistir várias vezes, não foi uma vez só. Até porque eu tinha acabado de ter um filho, muito processo, minha mãe doente, faltando dinheiro”, afirma. “Chegou um ponto que eu falei assim: ‘Cara, eu não aguento mais essa vida. Vou voltar a estudar, voltar a trabalhar. Não quero mais saber disso, não'”, diz. Os planos do MMA para ele, no entanto, eram bem diferentes. Em meio à maior desilusão da carreira e 12 anos após começar a lutar Raffael recebeu a notícia que todo lutador espera – foi convidado para o Contender Series, reality show do dono do UFC.
Rafael Cerqueira, lutador baiano do UFC
| Foto: Reprodução I Instagram
“Aí foi quando eu recebi a notícia do Contender. A chama aumentou, né? Mudou a chama. Até porque eu já não tinha nem mais vontade de treinar na época. Porque a gente acaba ficando desmotivado por tudo que tava acontecendo e tal”, explica.”Foi uma loucura. Um dia eu queria parar, no outro dia eu tava no UFC. Então, as coisas que Deus prepara pra gente são diferentes. Foi isso. Graças a Deus, eu tô aqui. Realizei meu sonho. Vou pisar aqui e vamos lutar”, garante.Não demorou até que Raffael fosse contratado diretamente para o UFC, e toda uma nova realidade de adversários começasse a bater na porta. “É totalmente diferente. Muita coisa mudou. A gente aqui lida com atletas que são preparados pra isso, só vivem disso. Então, é uma coisa totalmente diferente”, avalia.O Leão da BahiaJá dentro do UFC e treinando com Malhadinho, lutador baiano que acompanhou boa parte da carreira de Cerqueira, o soteropolitano deixou de ser Raffael para se tornar “The Lion”. “O Leão” em português, o apelido faz referência ao clube de coração do atleta, o Vitória.”Isso foi uma brincadeira lá na academia. Eu e o Malhadinho, uma brincadeira da gente. Perturbando, ele começou a me chamar de The Lion. A gente torce para o mesmo time, e o mascote do Vitória é o Leão. Acabou que ficou”, explica.
Rafael Cerqueira, lutador baiano do UFC
| Foto: Reprodução I Instagram
De volta para casa?Depois da luta, o sonho é voltar para casa, e da melhor maneira possível. Em outubro, dia 11, o UFC chega ao Rio de Janeiro, com um card de sonho para o Lion da Bahia. “Quem não quer lutar em casa, né? A gente sai de longe pra lutar fora. A gente quer lutar em casa também. Se acontecer, em nome de Jesus, será bem-vindo”, deseja. Hoje, Raffael é referência para jovens lutadores na Bahia que sonham em alcançar o maior palco do MMA mundial como ele, que deixa mensagens de fé e esperança para as futuras promessas do esporte baiano. “Acredite sempre em Deus. Deus pode tudo. Deus é quem nos fortalece. E nunca desista do seu sonho. Quanto mais as coisas estiverem difíceis, é porque está mais perto. Então, nunca desista do seu sonho. Sempre lute, batalhe e acredite nas pessoas que estão ao seu redor, querendo o seu bem. Acredite nos seus sonhos”, aconselha. Ficha técnicaNome: Raffael CerqueiraApelido: The LionCategoria: Peso meio-pesadoAltura: 1,91mPeso: 92kgEnvergadura: 76″Idade: 35Time: Galpão Da LutaPosição: CanhotoCidade: Salvador, BA