Bolsonaro em prisão domiciliar com tornozeleira: entenda a medida e quão comum a combinação é no Brasil


Bolsonaro em prisão domiciliar com tornozeleira: entenda a medida
Decretada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a prisão domiciliar funciona como uma alternativa à prisão e pode ser determinada pelos juízes antes ou depois da condenação – o que costuma acontecer com menor frequência.
A prisão domiciliar é um tipo de medida usada pela Justiça para garantir que os processos ocorram sem interferência nos casos anteriores ao julgamento. Ela é uma entre várias opções de medidas cautelares alternativas à prisão provisória – aquela que ocorre antes da condenação.
Em casos de pessoas já condenadas, a prisão domiciliar é menos utilizada e costuma ser concedida de modo humanitário para aqueles presos que têm problemas de saúde ou estão em idade avançada, como ocorreu com o ex-presidente Fernando Collor (leia mais abaixo).
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Números do sistema prisional brasileiro
Dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça e Segurança Pública indicam que há 235 mil pessoas que estão detidas provisoriamente ou cumprindo pena fora de unidades prisionais.
Dessas, 32 mil estão em prisão domiciliar anterior à condenação – é o caso de Bolsonaro – e 4 mil condenados cumprem penas em suas casas – é o caso de Fernando Collor. Em quase todos os casos (93%), ela é combinada com tornozeleira eletrônica.
Quantidade de pessoas no sistema prisional do Brasil
Arte/g1
As demais são pessoas que estão cumprindo pena em regime semiaberto ou aberto – situações que são diferentes de uma prisão domiciliar, segundo especialistas.
“No regime aberto, o preso tem que fazer um comparecimento ao fórum, tem que comunicar mudanças de endereço. Na prisão domiciliar, não se pode sair de casa. Há um raio, e você tem que permanecer ali. Os regimes semiaberto e aberto têm algumas condições diferentes de cumprimento da prisão domiciliar”, afirma o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho.
Botelho contribuiu com a elaboração e aprovação da Lei das Cautelares, sancionada em 2011, e responsável por popularizar a medida. A lei nº 12.403/2011 regulamentou as medidas cautelares no Brasil e estabeleceu as possibilidades para determinar a prisão domiciliar para uma pessoa. São elas:
ser maior de 80 anos;
estar extremamente debilitado por motivo de doença grave;
é responsável pelos cuidados especiais de criança menor de 6 anos ou com deficiência;
ser gestante a partir do 7º mês de gravidez ou em gestação de alto risco.
Especialistas ouvidos pelo g1, no entanto, consideram que esta lista não limita a aplicação da medida para pessoas fora destes perfis.
Neste texto, você vai entender sobre as seguintes perguntas:
Por que Bolsonaro está em prisão domiciliar?
Para quem pode ser concedida a prisão domiciliar antes da condenação?
Depois que acontece a condenação, quando a prisão domiciliar se aplica?
Prisão domiciliar com uso de tornozeleira é comum? Quando acontece?
Qual a diferença da prisão domiciliar para prisão em regime aberto?
Veja abaixo:
Por que Bolsonaro está em prisão domiciliar?
Bolsonaro foi colocado em prisão domiciliar por decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes.
Reuters via BBC
No caso de Bolsonaro, a prisão domiciliar aconteceu após a decisão de outra medida cautelar: o uso de tornozeleira eletrônica. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, determinou algumas restrições para o ex-presidente em 18 de junho por considerar que ele atuou em conjunto com o filho Eduardo em ações para instigar sanções impostas pelos Estados Unidos contra o Brasil.
Porém, em 4 de agosto, Moraes considerou que Bolsonaro descumpriu as restrições ao se comunicar com manifestantes e ter um vídeo compartilhado por outro filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Assim, houve agravamento da cautelar imposta, partindo do uso de tornozeleira para, além do monitoramento eletrônico, à prisão domiciliar.
Para a advogada criminalista Carolina Gerassi, a prisão domiciliar de Bolsonaro ocorreu após uma série de avisos de descumprimento das cautelares por parte do juiz do processo, o ministro Alexandre de Moraes.
“Trata-se de decisão que beneficia o réu e contrasta com a realidade da costumeira aplicação de prisões preventivas sob fundamentos genéricos, uma das principais causas da superlotação carcerária que tem como recorte pessoas racializadas (negras e pardas) e de baixa renda e escolaridade”, afirma a especialista.
Para quem pode ser imposta a prisão domiciliar antes da condenação?
Em casos anteriores à condenação, a prisão domiciliar faz parte de uma série de medidas que podem ser tomadas pelo juiz como forma de garantir que um processo possa seguir o seu curso normal até o passo final: o julgamento.
A prisão domiciliar antes de condenação é um tipo de medida cautelar (veja abaixo a lista de quais são). Ela é uma possibilidade anterior a uma decisão mais extrema, a prisão preventiva, em unidade prisional, da pessoa que ainda não foi condenada.
As medidas cautelares são acionadas como forma de evitar, por exemplo: uma eventual fuga do investigado; que o réu tenha contato com outros investigados e possa combinar versões a serem ditas em juízo; ou, então, evitar que o investigado ameace testemunhas e interfira no julgamento.
“Há um conjunto de alternativas à prisão preventiva, e uma delas é a prisão domiciliar. Há algumas possibilidades na lei, como pessoa maior de 80 anos, ou que tenha doença grave, ou que ela cuide de uma criança com menos de 6 anos. No entanto, defendo que este rol não é excludente, e a prisão domiciliar pode ser aplicada em outras hipóteses”, afirma Gabriel Sampaio, advogado e diretor da ONG Conectas, ex-membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
Além da prisão domiciliar, há outras medidas cautelares que podem ser impostas ao longo de um processo:
Fiança;
Medida protetiva (em casos de violência doméstica);
Proibições de contato ou acesso a pessoas e lugares,
Proibição de a pessoa deixar a comarca (local do juizado);
Comparecimento periódico ao juízo;
Recolhimento domiciliar (restrição de horários e/ou dias);
Suspensão de função pública (em caso de agentes públicos);
Monitoramento eletrônico;
Internação provisória (para pessoas inimputáveis por possuírem alguma questão mental).
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Depois que acontece a condenação, quando a prisão domiciliar se aplica?
A prisão domiciliar é mais restrita em casos depois que acontece uma condenação. Ela costuma ser relacionada a problemas de saúde do preso, segundo advogados criminalistas ouvidos pelo g1.
Pessoas com idade avançada ou com saúde debilitada condenadas a cumprir suas penas em regime fechado (em uma prisão), podem ser beneficiados pela medida.
“A prisão domiciliar pode ser concedida para a pessoa condenada e que tenha uma situação específica em que ela não conseguiria tratamento, por exemplo, no sistema penitenciário. E, aí, vai cumprir o resto da pena em prisão domiciliar”, afirma o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho.
Arruda cita como exemplo o caso do ex-presidente Fernando Collor, condenado a prisão a 8 anos e 10 meses em regime fechado por corrupção e outros crimes investigados na Lava Jato. Ele, no entanto, cumpre a pena em casa – um apartamento de cobertura com vista para o mar de Maceió (AL).
No caso de Collor, o ministro Alexandre de Moraes citou a idade (75 anos) e doenças do ex-presidente – apneia grave do sono, Doença de Parkinson e transtorno afetivo bipolar – para tomar a decisão.
Prisão domiciliar com uso de tornozeleira é comum? Quando acontece?
Sim, é bastante comum. A maioria das pessoas que estão atualmente em prisão domiciliar usam tornozeleira eletrônica, como é o caso de Jair Bolsonaro.
Mais 36 mil pessoas estão presas em suas casas seja antes ou depois da condenação, segundo dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) do governo federal. São quase 34 mil (93%) presos com monitoramento eletrônico e pouco mais de 2,6 mil (7%), sem tornozeleira.
Segundo Gabriel Sampaio, a decisão de implementar ou não a tornozeleira vai de juiz para juiz e do tipo de fiscalização que o magistrado pretende sobre o cumprimento da prisão domiciliar decretada.
“É uma questão de conveniência do juízo, que pode determinar ou não. A rigor, a monitoração eletrônica em si já é vista como uma cautelar específica e pode ser combinada com outras cautelares. Pode haver, por exemplo, restrição a ir até determinados locais e a tornozeleira permite monitorar essa vedação”, diz o advogado.
Qual a diferença da prisão domiciliar para prisão em regime aberto?
A prisão domiciliar é mais restrita do que o regime aberto, que normalmente é utilizado como fase final do cumprimento de uma pena que teve seu início com regime fechado ou semiaberto – o que é chamado de progressão de pena. Os juízes também podem condenar a pessoa a cumprir pena desde o início em regime aberto, o que não costuma acontecer com frequência.
No regime aberto, dizem os especialistas, a pessoa pode sair de casa para trabalhar, estudar e precisa comparecer de tempos em tempos no juízo para demonstrar que continua cumprindo com as determinações impostas pela Justiça.
Já a prisão domiciliar não prevê tal possibilidade: a pessoa tem de ficar 24h dentro da residência, local único em que deve cumprir a determinação dada pelo juiz.
A criminalista cita que existem alternativas para o caso de não existirem vagas nos albergues de regime aberto, como:
Comparecimento mensal ao fórum com comprovação de atividades lícitas;
Recolhimento noturno domiciliar;
e outras medidas que restringem a liberdade, mas não a prisão.
“O regime aberto é o regime mais próximo da ressocialização do condenado, porque permite o deslocamento para trabalho e estudo, com a permanência em casas do albergado, que não são estabelecimentos prisionais, mas albergues”, detalha Carolina Gerassi.
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