
Paes diz que negará alvará a quem tiver máquinas de apostas
Prefeito em exercício do Rio de Janeiro, Eduardo Cavaliere publicou nesta sexta-feira (22) um decreto que, na prática, proíbe máquinas de jogos eletrônicos no município — e a licença já concedida pode ser cassada em descumprimento.
A medida veio 1 dia após Eduardo Paes, que está viajando a trabalho, afirmar que negaria alvarás a estabelecimentos que instalarem esses equipamentos. O veto foi anunciado depois que o governador Cláudio Castro (PL) publicou um decreto autorizando esses equipamentos no RJ.
Na justificativa para o decreto, Cavaliere destacou que a instalação de equipamentos de apostas lotéricas em estabelecimentos comerciais descaracteriza a atividade originalmente licenciada, gerando impactos sociais, econômicos e urbanísticos.
Cavaliere argumenta que cabe ao município ordenar o uso do solo urbano e fiscalizar atividades econômicas, e que a proliferação de jogos em locais de livre acesso, sem regulamentação adequada, representa risco à saúde pública, à segurança urbana e ao desenvolvimento de crianças e adolescentes.
‘Decisão preocupante’
Ao anunciar que a prefeitura iria interferir na questão, Paes disse considerar a decisão de Castro “bastante preocupante”.
“Sair liberando máquinas de jogos por aí, através de um decreto, sem respaldo dos legisladores, sem debater o tema de maneira adequada, é uma medida no mínimo equivocada.”
“Eu vou procurar pessoalmente o governador Cláudio Castro na próxima semana para conversar sobre isso”, destacou.
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RJ regulamenta máquinas de apostas eletrônicas em bares e outros locais
O que diz o decreto de Castro
O decreto, que saiu na última terça-feira (19), regulamenta a exploração de modalidades lotéricas por meio de video lottery terminals (VLTs), totens, terminais de apostas e máquinas smartPOS no estado.
O texto estabelece que a operação será feita pela Loteria do Estado do Rio (Loterj), com todas as máquinas interligadas ao sistema. Impõe também uma série de exigências, como a que os pagamentos sejam feitos só por Pix, para identificação do usuário.
Como vai funcionar:
Pagamentos exclusivos via Pix: todas as transações terão de ser feitas por meio do sistema, vinculado ao CPF (no caso de brasileiros) ou passaporte (para estrangeiros).
Proibição de dinheiro em espécie e cartões: não será permitido o uso de cédulas, cartões de crédito ou débito, nem boleto bancário.
Autenticação multifatorial: login com QR code, biometria facial e mais um fator de verificação.
Cadastro obrigatório de jogadores (KYC): integração com bases públicas e privadas para verificar identidade, bloquear menores de idade e prevenir lavagem de dinheiro e jogo compulsivo.
Registro em log: todos os acessos e interações ficarão gravados em sistema auditável, disponível em tempo real para a Loterj.
Máquinas de loterias foram regulamentadas no estado do RJ
Reprodução/TV Globo
Onde poderão ser instaladas
Além das lotéricas e estabelecimentos credenciados, o decreto autoriza a operação em lojas VLTs / Sports Bar – espaços temáticos voltados para apostas, com transmissão de eventos esportivos e experiência de entretenimento.
Os “estabelecimentos não exclusivos” — como bares, restaurantes e mercados — também poderão instalar os equipamentos, desde que homologados e conectados ao sistema da Loterj.
O que fica proibido
O decreto veda expressamente a presença de slot machines, conhecidos como caça-níqueis, e outros equipamentos não homologados ou que não estejam integrados ao sistema central autorizado.
Qual a diferença para os caça-níqueis?
Segundo relatório do governo estadual, embora tenham aparência semelhante, os VLTs operam de forma distinta dos caça-níqueis tradicionais. Enquanto as máquinas ilegais usam geradores de números aleatórios locais — suscetíveis a manipulação —, os VLTs serão conectados a uma central monitorada em tempo real, com certificação e auditorias independentes.
65 mil empregos, diz Loterj
De acordo com o jornal O Globo, o presidente da Loterj, Hazenclever Lopes Cançado, afirmou que o programa pode gerar até 65 mil empregos e ajudar a impulsionar o turismo no estado.
“Não é apenas uma norma. É a consolidação do maior mercado regulado de VLTs do mundo, um marco que traz modernidade, segurança e responsabilidade, além de oportunidades reais”, disse.
A publicidade dos produtos deverá seguir regras, com limites para não atingir públicos vulneráveis. A Loterj também será responsável por campanhas educativas sobre o jogo responsável.
A expectativa é que o sistema comece a funcionar ainda este ano. Para ter a licença de exploração por 5 anos, a loteria terá que pagar R$ 5 milhões ao estado, além de repassar 5% da receita.
O advogado Miguel Godoy, professor da Universidade de Brasília (UnB), participou da consulta que a Loterj fez para implantar e regularizar esses jogos e aponta avanços no decreto.
“Diferentemente das máquinas caça-níqueis, que são ilegais e que funcionam isoladamente, os equipamentos físicos da Loterj vão ser conectados a uma central com monitoramento em tempo real. Isso elimina repetição, combinação e reduz o risco de manipulação. O segundo ponto positivo é a previsão de QR code e biometria facial, que exige autenticação dos jogadores e personaliza os limites de aposta.”
O que faltou, segundo especialista
Godoy, no entanto, destaca que algumas sugestões importantes não foram levadas em consideração.
“A autoexclusão voluntária dos jogadores e as pausas obrigatórias após períodos de jogos prolongados… Isso significa que o próprio jogador define a sua autoexclusão quando ele já gasta uma quantidade de dinheiro ou quando ele passa uma quantidade de tempo apostando. Esse é o mecanismo que poderia ter sido previsto e ainda não foi.”
Outro ponto que poderia ser aprimorado, segundo Godoy, é integração direta e automática com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), para prevenção contra lavagem de dinheiro.
O Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Rio reconhece que o decreto respeita a legislação, mas diz que a Loterj tem que se comunicar com absoluta clareza com os usuários.
“A publicidade tem que ser de acordo com o que a própria legislação prevê. Deve ter algumas frases que não seja apenas aquele “jogue com responsabilidade”. O que o Conar prevê são 10 frases diferentes, dentre elas aquelas que despertam atenção para o problema, como “vício do jogo”, ou “o jogo pode causar dependência”, ou “o jogo pode causar endividamento”, que são as coisas que deixam a questão transparente para o consumidor. Você pode escolher por jogar, mas sabendo que ele causa esses dois riscos potenciais”, diz Luciana Teles da Cunha, coordenadora do Núcleo.