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Se, de um lado, há aqueles que têm uma visão de futuro formada e por isso não vão levar a sério esses discursos sem fundamentação, do outro, há muita gente que faz desses discursos uma filosofia de vida. “O que vai impactar na própria qualidade de vida futura, uma vez que a maioria esmagadora de vagas de emprego no mercado continuam exigindo a formação escolar necessária”, explica a professora.Para a mãe de Kayan, de 10 anos, e Marcello, de 4, a jornalista e fundadora da agência Sensação Company, Tamires Moreno, esse discurso é extremamente perigoso não só para o futuro profissional das crianças, “mas também para a formação crítica e social de toda uma geração que vai vir a partir disso”, afirma.“Precisamos conversar com as crianças, aquelas que já possuem certo discernimento, que a monetização online pode ser uma oportunidade, inclusive para investir nos estudos, mas que ela jamais deve substituir o aprendizado que dá estrutura e preparo para uma vida”, explica.Durante a semana, os filhos de Tamires têm uma rotina focada em estudos e esportes, e não utilizam celular nesse período. O uso de telas é restrito ao fim de semana e em momentos específicos. Os dois possuem redes sociais geridas pela mãe, mas quem mais produz conteúdo é o estudante do 4º ano do fundamental 1, Kayan. Modelo mirim e lutador de jiu-jitsu, ele já tem mais de 11 mil seguidores, e gosta de postar vídeos dos treinos, projetos escolares, desfiles, momentos em família e parcerias. “Mas também gosto de brincar com meu irmão, meus amigos e meu cachorro Marlon, e posto sobre isso também”, conta Kayan.Um Dia de Repórter
Rillary, 10 anos, na internet desde 2017, e o pai, Ricardo, que costuma gravar os vídeos
| Foto: Raphael Muller / Ag. A TARDE
Modelo mirim, aspirante a repórter e engajada em diversas frentes, a estudante do 5º ano do fundamental 1, Rillary Castro Oliveira, 10 anos, produz conteúdo online desde 2017, quando postava vídeos brincando com a família. Hoje, com mais de 10 mil seguidores, a menina possui um quadro chamado Um Dia de Repórter, com o primo Arthur, usa o alcance para registrar a trajetória como modelo, falar sobre empoderamento e já viu de perto o conteúdo trazer bons resultados, a exemplo do vídeo sobre uma praça abandonada perto de casa.“Fiz um vídeo pedindo para a prefeitura dar uma atenção à praça e eles me ouviram. O senhor Edmilson Ferreira, assessor de comunicação da Seman, me ligou, disse que viu meu vídeo e que a prefeitura já tinha autorizado a reforma, e a mesma está sendo feita. Hoje, gosto muito de desfilar, dançar balé, fazer teatro e ir para a igreja. Quando crescer, penso em fazer faculdade de jornalismo ou direito. Aqui em casa, os estudos estão em primeiro lugar”, afirma Rillary.Ela conta que evita expor o corpo online, pois, mesmo que no momento possa ser engraçado, “futuramente pode ser prejudicial ou até cair em mãos de pessoas mal-intencionadas”. Muito disso ela aprendeu com o pai, o técnico em eletrotécnica Ricardo de Jesus Oliveira, que é quem grava quase 100% dos vídeos e que salienta o quanto essa recente discussão sobre adultização online é importante.“Há muitos vídeos de crianças e adolescentes online que são verdadeiros crimes. Porém, muitas crianças e adolescentes podem criar bons conteúdos de forma leve e sem perder o brilho de ser criança. Por isso, peço aos pais de influenciadores que nunca roubem a infância de seus filhos”, aconselha.Antecipação de comportamentos adultos em crianças
Paulino e a filha Dudinha: cuidados com a infância
| Foto: Shirley Stolze / Ag. A TARDE
O psiquiatra e professor do Instituto de Educação Médica (Idomed), José Péricles Magalhães Vasconcelos Filho, explica que a antecipação de comportamentos adultos em crianças tem o potencial de ser prejudicial, pois são demandas incompatíveis com o estágio de maturidade. “É como se a criança tivesse capacidade para receber e reagir ‘até um certo ponto’, e esse sendo ultrapassado pode gerar malefícios, como sobrecarga emocional, ansiedade, insônia e dificuldades de adaptação social”, adverte o psiquiatra.Pai da Maria Eduarda Gomes Silva, de 10 anos, a Dudinha, o operador de áudio Paulino Ribeiro da Silva conta que, desde cedo, a filha demonstrou interesse por câmeras e produção de conteúdo, o que levou os pais a registrarem momentos da infância no Instagram.Com o tempo, ela passou a integrar grupos como Estrelas Kids e Fashionistas de Salvador, participando de eventos e desfiles que estimularam o desenvolvimento artístico. “Durante a pandemia, intensificamos a produção de conteúdo com teatrinhos, fotos e situações do cotidiano. Esses vídeos têm contribuído muito para o desenvolvimento dela”, acredita o pai.Duda já tem mais de seis mil seguidores e um conteúdo diverso, que vai de receitas, leituras, lugares para visitar e até peças de teatro – uma das maiores paixões da garota, que está se preparando para estrear no espetáculo Anjo Preto de Branco, no Museu Afro-Brasileiro. “Gosto de postar sobre os passeios que faço, as receitas que faço com minha mãe e amo fazer teatro, então, de vez em quando, faço dublagem, mas a verdade é que nem todo mundo na internet é legal, então é preciso tomar bastante cuidado. Sempre escutem os pais, porque eles querem o nosso bem e sabem o que é melhor para a gente”, aconselha.Paulino explica que todos os conteúdos publicados passam pelo aval dele e da esposa antes, e que nada é aleatório: “Temos muito cuidado com a imagem e respeitamos, sempre, os limites e a vontade dela, mas, em casa, reforçamos aquela frase clássica: ‘Lugar de criança é na escola’. A educação sempre vem em primeiro lugar, e nos preocupa muito a forma como algumas crianças e adolescentes se posicionam nas redes sociais”.Os conteúdos problemáticos são diversos, indo desde a desvalorização dos estudos, desrespeito ao outro e abordagem de temas adultos como se fossem simples. “Discursos perigosos passam a ideia de que estudar é perda de tempo, o que pode causar danos profundos a toda uma geração. A infância é fase essencial, deve ser vivida com leveza, aprendizado, brincadeiras e convivência familiar. É possível fazer sucesso sem pular etapas importantes. Há muitos influenciadores mirins, atores e cantores que seguem estudando, brincando e vivendo a infância normalmente. É o exemplo que queremos que a Dudinha tenha”, afirma Paulino.Restrição do celularnas escolas ganhanovos contornosEm meio às discussões sobre como combater a adultização de crianças e adolescentes e protegê-los nas redes sociais, o Ministério da Educação (MEC) destaca a restrição ao uso de celulares nas escolas como uma ação importante do governo federal.A Lei 15.100/2025, que restringe o uso de celulares nas unidades de ensino, entrou em vigor em 13 de janeiro. A medida é uma resposta ao crescente debate sobre o uso desses aparelhos no ambiente escolar, mas, segundo o ministro da Educação, Camilo Santana, é preciso avançar ainda mais nessa discussão.Para o ministro, é fundamental que o Brasil regulamente as plataformas digitais. “Nós precisamos cada vez mais ter regras e leis restritivas. O que já conseguimos foi limitar o uso nas escolas. Hoje, é proibido, a não ser com orientação para fins pedagógicos, com orientação do professor. Mas é importante também os pais terem a consciência de acompanhar o uso desse equipamento dos seus filhos”, ressalta.O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que o governo federal enviará um projeto de lei ao Congresso para regulamentar o tema. Lula afirmou que “é preciso criar o mínimo de comportamento, o mínimo de procedimento no funcionamento de uma rede digital que fala com crianças e com adultos e que, muitas vezes, ninguém assume a responsabilidade pelo conteúdo”.Camilo Santana alerta que, antigamente, os pais se preocupavam com os filhos fora de casa. “Hoje, os riscos estão dentro de casa, no quarto do filho, na sala de estudos. É importante esse cuidado da orientação, do monitoramento dos pais, das crianças, adolescentes e jovens do País”, conclui.