
Conheça a lenda do Unhudo de Mineiros do Tietê
Um ser estranho, semelhante a um morto-vivo, com unhas longas e afiadas, cabelos compridos, roupas velhas e um chapéu de palha. É assim que a população de Mineiros do Tietê , no interior de São Paulo, descreve sua mais conhecida lenda: o Unhudo.
Antônio Paulo Teixeira do Amaral, mais conhecido como Paulo Português, é referência no assunto. O ex-peão de rodeio se tornou o principal guardião da lenda folclórica do Unhudo em Mineiros do Tietê, e, hoje, mantém um projeto de sítio-escola que busca utilizar a lenda para conscientizar a população, principalmente as crianças, sobre a importância da preservação da natureza.
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Segundo a tradição, o Unhudo é o protetor da região da Pedra Branca e castiga quem tenta roubar frutas ou agredir a fauna com a caça de animais silvestres.
Boneco do Unhudo exposto por Paulo Português
Gabriel Castro/g1
Nesta sexta-feira (22) é comemorado o Dia do Folclore. Para além das lendas nacionais mais conhecidas, como Saci, Boi-Tatá e Curupira, o g1 investigou a história de uma figura clássica do interior paulista que atravessa gerações e cidades.
Hoje, a lenda do Unhudo é contada também em Dois Córregos, Barra Bonita, Jaú e até em Brotas, a mais de 50 km do município onde tudo começou.
Paulo Português da vida ao Unhudo em Mineiros do Tietê
Gabriel Castro/g1
Foi Paulo Português quem explicou, em entrevista ao g1, a origem da lenda. Assista ao vídeo acima. De acordo com ele, antes de se tornar um ser sobrenatural, o Unhudo foi Major Cesário, proprietário de terras na região do Baixão da Serra.
“O Unhudo é um homem que morava no Baixão de Serra. Ele era um major, Major Cesário. Era proprietário de umas terras lá e tinha muito ciúmes dessa terra. E ele não gostava que as pessoas invadissem a propriedade sem ter permissão dele. Isso em vida. Aí, quando estava doente, pediu para ser enterrado na propriedade dele, que ia ficar lá para ninguém. Mas o que fizeram? Levaram e enterraram ele no cemitério de Dois Córregos.”
Baixão da Serra da Pedra Branca em Mineiros do Tietê (SP)
Reprodução/TV TEM
Segundo a crença, o major não aceitou a decisão e retornou à fazenda após a morte. Desde então, passou a vagar pela Pedra Branca, protegendo suas terras e atacando invasores.
“A lenda conta que ele ficou vagando, a alma não foi embora. Criou-se essa história de que existia um ser que ficava lá e, quando as pessoas iam, ele agredia e as mandava embora, não aceitava que ficassem lá.”
Major Cesário, de Mineiros do Tietê (SP)
Reprodução/TV TEM
Paulo conta que o Unhudo era conhecido por dar tapas e jogar invasores no Rio Tietê, a cerca de 20 km de distância: “Ele atacava quando as pessoas invadiam a propriedade, a natureza, sem permissão, pegavam animais ou frutas. Ele aparecia, dava um tapa e jogava no rio. Do Baixão de Serra até o Tietê, rapidinho”.
Muitas cavalgadas foram feitas para tentar encontrar o Unhudo, mas nenhuma teve sucesso. Sempre aconteciam situações fora do controle. Uma delas, nos anos 2000, reuniu peões de toda a região. Um homem foi arremessado do cavalo após algo atingir o animal. O cavalo morreu, mas o cavaleiro, de mais de 100 quilos, saiu ileso.
“Já aconteceram coisas graves. Pessoas se perdendo na mata, sem saber o caminho de volta. Quem ia procurar boi não conseguia achar, acabava indo parar em outra propriedade. É coisa de dar medo. Fizemos caçadas à noite, todo mundo de várias cidades. No amanhecer, nos encontrávamos na Pedra Branca, mas, em um episódio, algo bateu no cavalo de um cara e o jogou com o cavalo. O cavalo morreu, ele ficou bem.”
Cavalgadas em busca do Unhudo em 2011, na cidade de Mineiros do Tietê (SP)
Reprodução/TV TEM
As buscas eram organizadas por Paulo e seu pai, Celso Teixeira do Amaral, mas foram encerradas devido ao clima pesado e a relatos de forte energia espiritual.
“Foram feitas outras e começamos a parar, porque o clima ficou muito pesado. O pessoal mexia com a parte espiritual do negócio. Não tinha entendimento ou conhecimento disso. Existia uma energia diferente lá. Meu pai dizia que o Unhudo se transformava em animais: cobra jiboia, capivara, onça, e também em brisa. Era uma energia espiritual.”
O fascínio de Paulo pela lenda vem da infância, ouvindo as histórias de seu pai, que chegou a registrar o caso em 2011 no cartório da cidade para preservá-lo como patrimônio cultural da cidade: “Meu pai veio de Rio Claro e foi pioneiro aqui, abrindo estradas com maquinário. Ele trouxe a lenda para Mineiros do Tietê e registrou que a Pedra Branca pertence ao município e o Unhudo como protetor da região”.
Celso, pai de Paulo Português, registrou a lenda do Unhudo no cartório de Mineiros do Tietê (SP)
Reprodução/TV TEM
Projeto Sítio-Escola
Projeto Sítio-Escola busca conscientizar as crianças sobre a natureza
Gabriel Castro/g1
Além de manter viva a história, Paulo utiliza a lenda para ensinar crianças sobre a importância da preservação ambiental. Em seu sítio, ele recebe alunos da rede municipal e os leva a trilhas que recriam o caminho do Unhudo.
A área da Pedra Branca, distante mais de 20 km da cidade e acessível apenas por estradas de terra, tornou-se um espaço educativo. Para facilitar o trajeto, Paulo está reformando uma área herdada de seu pai, transformando-a em trilha interpretativa.
Segundo a lenda, o major voltou para sua fazenda e passou a vagar pela região
Gabriel Castro/g1
As visitas também incluem aspectos históricos, como a passagem de Dom Pedro pela região e sua visita a uma cachoeira, além de um rio de águas limpas que simboliza a importância da conservação.
Durante os passeios, Paulo veste um poncho semelhante ao que o Major Cesário teria usado em vida. O auge é no fim da atividade: reunidos ao redor de uma mesa, com a figura do Unhudo ao centro e a noite caindo, as crianças ouvem dele a mensagem final:
“O projeto é cuidar da natureza, dos rios, dos animais, e ensinar para as crianças como cuidar do mundo em que vivemos. O Unhudo é o protetor da natureza, de fato.”
Caminhada pelo Sítio-Escola em Mineiros do Tietê termina em riacho
Paulo Piassi/g1
O Dia do Folclore
O Dia do Folclore é celebrado mundialmente em 22 de agosto, data escolhida porque, em 1846, o escritor inglês William John Thoms criou o termo “folklore”, unindo “folk” (povo) e “lore” (saber), para definir os conhecimentos tradicionais transmitidos de geração em geração.
No Brasil, a data foi oficializada em 17 de agosto de 1965, por meio do Decreto nº 56.747, assinado pelo então presidente Humberto de Alencar Castello Branco e seu ministro da Educação, Flávio Suplicy de Lacerda.
O objetivo era valorizar e preservar o patrimônio cultural brasileiro, incentivando estudos e práticas que mantêm vivas as tradições populares.
Boneco do personagem exposto pela cidade
Gabriel Castro/g1
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